Amazon: a Porta da Esperança?

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File of a box from Amazon.com is pictured on the porch of a house in Golden, Colorado

A chegada da Amazon ao Brasil trouxe um novo ânimo para todo escritor iniciante que não conseguia espaço em uma grande editora, e tampouco possuía dinheiro suficiente para investir no lançamento de seu livro através de uma pequena ou média editora.

A possibilidade de publicar sua obra em formato digital, vendê-la para o mundo inteiro e ainda ganhar 70% de lucro sobre o preço de capa, que você define, é realmente sensacional.

E eu não sou nem louca de criticar a Amazon ou quem publica através dela. Muito pelo contrário. Eu mesma acabo de me cadastrar, e acho que, por meio de sua plataforma, alcançamos a maioridade no que diz respeito à democracia literária.

PORÉM – e sempre há um porém – algumas pessoas parecem excessivamente deslumbradas com as possibilidades oferecidas pela Amazon, parecendo esquecer-se de que, para vender livros, não basta disponibilizá-lo ao público leitor. É preciso mais.

Bem mais.

Decidi escrever sobre este assunto após ler uma matéria publicada no site Escribe Romántica, intitulado Como Publicar na Amazon (de graça!). O texto diz tudo o que o novo autor quer ouvir e acreditar. Frases como “… a Amazon está mudando a vida de centenas de escritores, que há poucos meses atrás não conseguiam divulgar-se, e agora estão sendo descobertos por milhões de fãs e contratados por grandes editoras”; ou “Você pode dividir listas de best-sellers com autores consagrados como Paulo Coelho”; ou ainda “Você pode ganhar a vida escrevendo livros comodamente em sua casa”.

Risos, muitos risos.

E o pior é que vários autores não só acreditam nisso tudo, como têm certeza absoluta de que a Amazon é uma espécie de Porta da Esperança para o novo autor.

Primeiro ponto que precisa ser compreendido: publicar e divulgar são duas coisas completamente diferentes, amigo.

A ideia de que basta cadastrar seu livro na Amazon e você vai vender tal qual pão quente no fim da tarde é tão absurda quanto acreditar que você vai publicar um livro em formato tradicional, através de uma editora tradicional, e vai vender tal qual pão quente no fim da tarde.

Publicar é uma coisa – muito simples e acessível, aliás. Divulgar é outra coisa, bem diferente e bem, bem, bem mais cara.

Logo, pouco importa se o seu livro está na Amazon, no catálogo de uma editora ou na estante da livraria. Importa se alguém quer lê-lo. E para alguém querer lê-lo, precisa antes saber que o livro existe. E para isso, por fim, é necessário divulgação.

Segundo ponto: confesso que sei de pessoas que publicaram seus livros através da Amazon e hoje estão ricas e famosas escrevendo comodamente em suas casas. Uma delas é E. L. James, a autora de Cinquenta Tons de Cinza, que vendeu 250 mil e-books através da Amazon antes de ter os direitos adquiridos por uma grande editora e vender muitos milhões de exemplares em todo o sistema solar.

Contudo, também sei de pessoas que pagaram para publicar seu primeiro livro e hoje estão igualmente ricas e famosas escrevendo comodamente em suas casas. Uma delas se chama Paulo Coelho. O escritor pagou para publicar seu primeiro livro, Arquivos do Inferno, em 1982 – cujo exemplar, hoje, pode custar até cinco mil reais.

O que quero dizer com isso: não confundam meio com mensagem. Se o livro for bom, se estiver bem escrito, se possuir apelo comercial (leia-se público leitor), ele venderá, independente se estiver escrito em papel higiênico, em PDF ou em papel pólen 90g.

Logo, publicar pela Amazon não torna automaticamente seu livro um fenômeno de vendas. O que fará de seu livro um sucesso ou um fracasso é seu conteúdo, e aí pouco importa se este conteúdo estará disponível em e-book, em um blog ou em um livro tradicional.

Terceiro ponto: se você mora no Brasil, ESQUEÇA ganhar a vida escrevendo livros comodamente em casa. Veja que ambos os exemplos que dei são de escritores que publicam no Brasil, mas publicam também (e principalmente) fora do Brasil. Em terras tupiniquins, nem mesmo renomados escritores ganham a vida escrevendo comodamente em casa. Que dirá eu ou você. Um dos maiores prêmios literários do país, o Jabuti, paga um troféu e R$3.500 (valor bruto) para o primeiro colocado de cada categoria.

Um troféu e R$3.500 (valor bruto!) para o melhor livro do país em cada categoria.

Escritores escrevem, mas não escrevem apenas livros. Escrevem peças, reportagens, matérias, crônicas, roteiros, colunas semanais, slogans. Isso quando não dão palestras, oficinas, aulas, editam livros, trabalham em agências de publicidade ou em repartições públicas.

E é assim que pagam suas contas. Se dependessem somente da venda de seus livros, passariam fome, literalmente.

Contudo, o mais impressionante sobre esta questão envolvendo a Amazon é a ideia delirante que muitos ditos escritores têm do mercado editorial. A maioria sequer vê o mercado editorial como um mercado. Tratam a publicação de seu livro não como um trabalho como outro qualquer, mas como um “sonho”, envolto em muito romantismo e fantasia.

Acreditam piamente que irão publicar hoje e amanhã já estarão na lista dos mais vendidos, sentados de frente com Gabi, ganhando rios de dinheiro e tendo fãs histéricos atacando no supermercado para pedir autógrafo.

E, o pior: a maioria destes escritores não consegue escrever três linhas sem cometer pelo menos três erros gramaticais bizarros.

Então eles publicam na Amazon e, um mês depois, venderam cinco livros – pra mãe, pro pai, pra vó, pro tio e pro primo. Aí vem a frustração, claro, pois eles realmente acreditaram no que matérias como esta que citei, do site Escribe Romántica, diziam. Naturalmente o sujeito, ao invés de procurar por novas alternativas; ao invés de buscar se aperfeiçoar e aprender que “concerteza” não existe, prefere se tornar um rancoroso azedo que passa o tempo todo falando mal das editoras, da Amazon, do mercado editorial, dos leitores, dos escritores, do país e do universo, sem perceber que, na realidade, quem errou foi ele, que “concerteza” superestimou seu talento literário.

Não há mais espaço para gênios, ainda mais em um mundo onde, finalmente, a literatura democratizou-se em definitivo. Até pouco tempo, ou você publicava através de um grande selo, ou azar o seu. Hoje, além de existirem dezenas de editoras especializadas na publicação do novo autor, ainda existem plataformas como a Amazon e a Publique-se, da Livraria Saraiva, que oportunizam a publicação de novos escritores – e de graça.

Não tenho dúvidas de que o escritor que souber aproveitar tem tudo para encontrar seu lugar ao sol, seja através da Amazon, através de uma publicação independente, através de uma editora tradicional ou de todas as alternativas acima citadas.

Mas o meio nunca poderá fazer nada pela mensagem.

Logo, apenas disponibilizar seu livro na Amazon, acreditando que isto basta para que ocorra sua efetiva comercialização – e mais: seu estouro literário interplanetário – é risível.

Sem divulgação e sem uma boa história, não importa onde a obra estará: ela não vai vender.

Porque, se fosse tão fácil assim, não haveria mais autores desconhecidos neste mundo. Estaríamos todos de frente com Gabi.

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É produtora cultural e escritora, autora dos livros Uma Carta por Benjamin (Ed. Multifoco, 2009) e O Túmulo do Ladrão (Ed. Multifoco, 2013). Colunista da revista Café Espacial, publicou pela Mojo Books a historieta Pela Honra de Meu Pai. Publicou em mais de quinze coletâneas, e organizou seis em parceria com outros escritores. Foi editora da versão brasileira da revista eletrônica inglesa 3:AM Magazine, e também uma das idealizadoras do projeto E-Blogue.com (in memoriam). Atualmente trabalha na Editora Os Dez Melhores e é redatora na agência Teia de Marketing Literário Virtual.

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