Made in Brazil: 5 escritores-diplomatas brasileiros

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Diplomacia literária Made in Brazil: alguns escritores-diplomatas da nossa terra

Vinicius de Moraes, um dos nossos escritores diplomatas
Vinicius de Moraes, um dos nossos escritores diplomatas

Há autores e autoras cujo talento transcende as fronteiras, tornando-se assim embaixadores não oficiais do Brasil. No entanto, também existem aqueles que representaram o país tanto cultural quanto diplomaticamente. Abaixo listamos alguns  dos mais famosos escritores-diplomatas.

Raul Bopp (1898-1984)

Um dos nomes mais originais do Modernismo (e também um dos pouco comentados), Raul Bopp era um homem realmente inquieto. Realizara várias andanças por sua terra natal, Rio Grande do Sul. O nomadismo caracterizou até mesmo a sua formação, afinal passou pelas faculdades de Direito de Porto Alegre, Recife e Belém antes de se graduar na capital federal.

Em 1932, seu amigo Getúlio Vargas, então presidente, o nomeou cônsul. Sua primeira missão? O Japão. Naquele momento, Vargas procurava atrair simpatias tanto dos países fascistas quanto dos liberais. Quando, no meio da Segunda Guerra Mundial, teve de escolher um lado, o Brasil optou pelo dos Aliados, liderados pelos Estados Unidos.

Portanto, não é coincidência que o próximo posto do poeta tenha sido como agente diplomático em Los Angeles. Aposentando-se em 1963, Bopp pôde dar um fim a uma angústia expressa no poema Verso de um Cônsul:

A almazinha do meu filho

vai se compondo e decompondo

com pedaços de pátria misturada.

João Guimarães Rosa (1908-1967)

De Cordisburgo para o mundo: o ingresso do escritor mineiro no Ministério das Relações Exteriores se deu antes da criação do Instituto Rio Branco (1943), órgão responsável pela preparação dos futuros diplomatas. No entanto, ele já possuía duas qualidades que são até hoje requisitadas pelo Instituto: vasta erudição e discrição.

Indicado para o Consulado do Brasil em Hamburgo em 1938, Rosa não só assistiu à ascensão do nazismo como a reportou minuciosamente ao Itamaraty. Após a Segunda Guerra Mundial, o Brasil estreitou relações com a Alemanha Ocidental e o escritor pôde retornar diversas vezes ao país, talvez um dos que tenha manifestado maior interesse em traduzir a obra roseana.

O desejo de viver próximo da sua matéria-prima, a cultura brasileira, fez com que aceitasse um cargo na Divisão de Demarcação de Limites e Fronteiras, departamento que poupava seus membros de longas estadias fora do país. Em 1966, precisou se posicionar diante da questão da Catarata das Sete Quedas, território reivindicado por Brasil e Paraguai.

Um ano depois, idealizou e organizou um encontro de países amazônicos em Manaus. A proposta de Rosa lançou sementes que só germinariam em 1978 com a assinatura do Tratado de Cooperação Amazônica. Com a união dos estados vizinhos, o autor de Sagarana acreditava que a ameaça de internacionalização da Amazônia pelas grandes potências poderia ser afastada.

Vinicius de Moraes (1913-1980)

O Poetinha já tinha experiência enquanto funcionário do Ministério da Educação e domínio do inglês quando ingressou no antigo Palácio Itamaraty em 1943. Também já era assíduo frequentador dos bares cariocas e um profícuo autor de sonetos.

Sua primeira missão foi como vice-cônsul em Los Angeles em 1946. Passaria ainda por Paris e Montevidéu antes de ter sua carreira interrompida. Insatisfeito com os hábitos de Moraes (que, como conta a jornalista Liana Wenner em livro recente, marcaram tanto o Uruguai quanto a Argentina), o presidente marechal Costa e Silva pronunciou-se de modo nada sutil: “Demita-se logo esse vagabundo!”.

O fato é que Vinicius de Moraes desafiava não só as convenções exigidas ao diplomata (principalmente no que se refere à discrição), mas também a moral conservadora de Buenos Aires e Montevidéu, ao ponto de se tornar um ídolo da juventude progressista local. Enquanto compositor, apresentou a esses países um universo colorido e encantado nos diversos shows que organizou ao lado de colaboradores como Toquinho e Maria Bethânia.

Mesmo após ser demitido, em 1969, o Poetinha continuou frequentando a ponte aérea Rio de Janeiro-Buenos Aires-Montevidéu. As viagens foram interrompidas quando um membro do seu show desapareceu misteriosamente em 1974. Provavelmente foi capturado pelas forças de repressão das ditaduras do Cone Sul.

João Cabral de Melo Neto
João Cabral de Melo Neto

João Cabral de Melo Neto (1920-1999)

João Cabral entrou para o funcionalismo público nos anos 30, prestando concurso para o Instituto Rio Branco em 1945. Apesar de louvar em versos a cultura flamenca, sempre celebrava com sua “poesia áspera” Recife, o rio Capibaribe e os canaviais.

Em 1950, foi afastado da função por suspeita de ser comunista, sustentando-se por um bom tempo apenas com o dinheiro que ganhou do IV Centenário de São Paulo pelo seu poema O Rio. Posteriormente, foi reintegrado ao serviço.Em 1964, novo susto: seu nome apareceu numa lista de 11 diplomatas que deveriam ser cassados por “subversão”, mas contatos pessoais conseguiram dissuadir os militares de tal atitude.

O auge da carreira de João Cabral enquanto diplomata se deu na segunda metade da década de 1970, justamente quando o Brasil ensaiava uma política externa mais voltada para os países do chamado Terceiro Mundo. A trajetória do poeta exemplifica muito bem essa posição: passou por países africanos antes de se concentrar na Península Ibérica, chegando ao posto de cônsul geral do Brasil na cidade de Porto, em Portugal.

José Guilherme Merquior (1941-1991)

Crítico literário precoce (iniciou colaborando para o Jornal do Brasil na casa dos dezoito anos), Merquior, tão logo bacharelou-se em Filosofia em 1963, entrou para o Ministério das Relações Exteriores.

Enquanto cuidava de assuntos burocráticos, desenvolvia uma sólida carreira universitária, diplomando-se em vários cursos e lecionando em universidades brasileiras e europeias.

Na condição de terceiro secretário da Embaixada do Brasil em Paris, acompanhou todas as agitações do Maio de 1968 e ao longo dos anos apenas reforçou sua opinião desfavorável sobre o movimento. Merquior via como perigosa e irresponsável a dura crítica à modernidade e ao humanismo clássico, do qual era admirador confesso, campeada pelos pensadores ligados a esse grupo.

Destacou-se como ensaísta, especialmente de poesia. Verso e Universo de Drummond é um dos seus títulos mais importantes nessa seara. Merquior foi o maior responsável por consagrar o “itabirano” no exterior com diversas palestras e livros.

Referências:

D’ARAÚJO, Maria Celina et ali. (Orgs.). Sem medo da diplomacia: João Clemente Baena Soares. Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 2006.

MASSI, Augusto (Org.). Poesia completa de Raul Bopp. Rio de Janeiro/ São Paulo: José Olympio/Edusp, 1998.

RIBEIRO, Guilherme Leite. Bastidores da diplomacia: o Bife de Zinco e outras histórias. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2007.

WENNER, Liana. Vinicius Portenho. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2012.

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