Resenha: A Morte é Legal – Jim Anotsu

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“Deixe-me esclarecer as coisas. Antes que eu mesmo as escureça…”, para já começar com um trecho¹ de uma música da mixtape do livro. A Morte é Legal, de Jim Anotsu, publicado pela Editora Draco; foi, sem dúvidas, um dos livros mais surpreendentes que eu li em 2012. Sabe quando você pega aquele monte de páginas – pois racionalmente não passa disso, mas quem disse que humanos são racionais? –  e a devora as páginas, de modo que nada mais importa? Então, este é o livro de Jim Anotsu, uma lontra, segundo ele.

Andrew é um garoto normal. Na verdade, estonteantemente – para usar um adjetivo alá Douglas Adams – normal. Ouve Hard-core emocional e lê muitos livros, fica evidente que é um anglófono de plantão; e apesar dos 19 anos, não arrumou um emprego como os garotos comuns fariam, ele escreve o livro A Violinista de Fevereiro, durante a trama. O que ele não poderia esperar foi o encontro inusitado numa tarde comum da cidade de Dresbel. O gatilho da história coloca o personagem principal diante de uma escolha, ele que até o momento se escondia atrás do cachecol antes de tomar qualquer decisão. A partir daí, o leitor conhece uma das personagens mais importantes do livro, a simpática Ive, a princesa do fim inevitável (risos). Além disso, a relação de amizade de Jonas e Amber, a irmã de Andrew, é outro ponto forte e emocionante do livro.

… Deveria estudar alguma coisa útil como engenharia ou odontologia, pensava, ou no mínimo procurar um emprego.
Tudo. Exceto escrever. O velho Platão expulsou os poetas de sua república real! – exclamava consigo. – Contudo, não seria feliz acordando de manhã e indo para um emprego entediante onde colocaria dinheiro nos bolsos de alguém provavelmente menos inteligente do que ele. (pg. 41).

A profusão de personagens é incrível, para citar pelo menos três que me surpreenderam:
Rayla: A irmão mais velha de Ive e responsável por cumprir com toda a burocracia do mundo espiritual.
Prozzy: a coelha, pessimista ao extremo, de estimação de Ive (para não dar spoilers).
O Gato: ser mais poderoso do universo com três nomes.

Os personagens têm profundidade diante da narrativa de capítulos curtos de Anotsu. Um exemplo bem forte disso foi quando comecei a entender as motivações de Rayla, ao ser tão dura e fria. Outro exemplo, é a forma como Andrew age diante das situações, graças ao que o autor fala sobre a mãe do personagem, fica claro.

Andrew nunca sentiu tanto medo quanto naquele instante. Para uma pessoa como ele, ter sua imaginação roubada seria o pior tipo de sofrimento possível. O pequeno conceito de felicidade que habitava a sua vida provinha da imaginação e se isso fosse tomado, não haveria muito pelo qual viver. (pg.  55).

Para mim, algo que ficará marcado na leitura deste livro é a identificação com o personagem principal. Separei duas citações que me fizeram sentir-me “em casa”:

Eu sei o que você sente. É como gostar de maçãs num mundo que serve apenas bananas. A gente pode ser diferente de todos e realizar os nossos sonhos. (pg. 100)

Não gostava de ser obrigado a dirigir. Odiava automóveis! Todo garoto da sua idade parecia pensar neles durante cada segundo, mas lhe parecia absurdamente idiota a ideia de desejar uma lata que serviria apenas para consumir seu dinheiro em impostos e combustível. (pg. 216).

Outra detalhe a se destacar, é o trabalho de design gráfico do livro. Só pela capa e edição, já valeria a pena!

Para finalizar, afirmo que estou naquela ressaca literária de querer passar mais tempo lendo aquele livro e convivendo com aqueles personagens. Pouca coisa valeu tanto a pena como os olhares estranhos que eu recebi ao circular no terminal de ônibus com este livro de capa roxa.

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¹A música em questão é Bolha-Canção, da Banda Café Brasilis. A mixtape completa pode ser baixada aqui.

 

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