Se você ainda não leu a Divina Comédia, aqui vão sete bons motivos para entrar nesse mundo dantesco
A Divina Comédia, de Dante Alighieri, é um clássico, um livro absoluto, uma daquelas obras que todos falam por causa da sua força e… É, tudo isso é verdade, mas tem muita gente que ainda não a leu. Seja lá qual for o motivo, elencamos sete razões para ler a grande obra de Dante. Se elas não forem capazes de te convencer, talvez só um mundo dantesco te fará mudar de ideia.
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1) É o primeiro dos grandes livros ocidentais a ser escrito numa língua vernácula
Pode não parecer muito, mas se você pensar que Dante terminou de escrever a obra por volta de 1320, e as literaturas vernáculas (não escritas em latim) só começaram a ser escritas no fim do século XV, é algo importante de se considerar. Além disso, o fato de ter escritor numa língua considerada feia na época (isso mesmo, no começo do século XIV, o italiano, ou o dialeto que viria a se tornar o italiano, era considerado um idioma menor, sem graça) mostra que o autor, além de talento, tinha coragem e era inovador.
2) É o primeiro (e maior) épico moderno
A lista de grandes épicos escritos antes da Divida Comédia é grande: Ilíada e Odisseia, de Homero, Eneida, de Virgílio, etc. (para ter uma ideia, clique aqui). Todos seguiam o mesmo modelo estabelecido por Homero, quer na forma, quer nas partes, quer no que fosse. Dante, porém, preferiu criar uma estrutura própria, o que incomodou muita gente após a publicação, póstuma, do livro. No entanto, parte do charme da obra vem dessa mistura de novidade e antiguidade. Ao mesmo tempo em que estamos lidando com um épico, o ar de novidade é inevitável, principalmente para aqueles que tiveram a coragem de atravessar os outros dois épicos supracitados que, por melhor que sejam, acabam, por vezes caindo na monotonia da forma.
3) Simetria do número três (terça rima)
Se há algo se importante no poema, é o número três. Tudo gira em torno dele: são três partes (Inferno, Purgatório e Paraíso), divididos em tercetos (são 14.233 versos em 4774 tercetos) e assim por diante. Essa obsessão com o número três é acrescida de vários estudos feitos que mostram, às vezes com razão e outras nem tanto, que a obra é construída em núcleos de três partes dentro de cada grande núcleo, sendo cada subnúcleo dividido em três partes e assim por diante.
4) Descida ao inferno
Nos épicos anteriores, era normal ter um trecho no qual o herói descia ao submundo/mundo dos mostros. Foi assim na Eneia e na Odisseia. No entanto, nada, absolutamente nada, compara-se ao inferno de Dante (tanto que hoje o adjetivo dantesco significa, segundo o Houaiss, algo de grande horror, diabólico, medonho, pavoroso). Há de tudo nos círculos desse lugar, até um Papa enterrado num deserto de gelo e com os miolos expostos (e lembrem, ele era católico devoto). As imagens, mesmo hoje, impressionam e causam terror aos leitores.
De quebra, Dante conseguiu sedimentar, e mesmo criar, a nossa visão sobre o inferno, o diabo e toda a mitologia que envolve o lado de baixo.
5) É uma das obras decisivas e mais influentes da literatura e da cultura ocidental
São poucos os escritores, críticos e leitores que negam o valor da obra. De Jorge Luis Borges a Boccaccio (que acrescentou o adjetivo divina a Comédia), todos elogiam e escreveram, plagiaram ou homenagearam o texto do poeta florentino. Não obstante esse fato, é comum marcar a literatura e as mudanças ocorridas nela do lado ocidental com base na escrita de três obras: Ilíada, Dom Quixote e, claro, Divina Comédia.
Sua influência, no entanto, é muito maior e chega em campos que o próprio Dante não compreenderia: há discos de trash metal inspirados na obra (Dante XXI, do Sepultura), bem como prédios inspirados na cosmogonia (o Palácio Barolo, em Buenos Aires); também existe jogos de vídeo-game inspirados no famoso inferno dantesco (Dante’s Inferno, lançado em 2010 pela Eletronic Arts) e o ex-papa, Bento XVI, afirmou em entrevista que sua primeira, Deus caritas est, foi inspirada pelo canto XXXIII do Paraíso. Nem mesmo os desenhos japoneses escaparam dessa influência. Na saga O inferno de Hades dos Cavaleiros do Zodíaco, todo o inferno, assim como vários personagens, foram inspirados por esse poema. Dentro da literatura é um sem-fim de influências que fica difícil citar todos. Então, para se ter uma ideia de até onde a influência da Divina Comédia chegou, clique aqui.
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6) Harold Bloom, o crítico mais chato do mundo, gosta dela
Ele é provavelmente, e será durante muitos séculos, o crítico mais chato da face da terra. Seu amor por Shakespeare é tanto que ele já propôs (risos, muitos risos) que lêssemos Freud fazendo uso das peças do bardo inglês. Mesmo assim, Bloom consegue achar um lugar no seu coração e nos seus livros críticos para o poema de Dante. Em O cânone ocidental, por exemplo, o crítico americano deixa escapar, num momento de clara fraqueza, que “o poema de Dante possui uma qualidade inominável, talvez tão grande quanto os melhores versos de Hamlet ou Rei Lear.” Não bastasse isso, Bloom ainda elenca as várias razões para colocá-la como a segunda maior obra da literatura ocidental, depois de Hamlet, óbvio. De fato, uma obra capaz de agradar o crítico mais chato do mundo merece sua atenção.
7) É muito divertido
Aparte todas as razões acima, há uma que é a principal: ler a Divina Comédia é absolutamente divertido. É uma obra fascinante em vários sentidos: tem ritmo, é sonora e poética, há sempre algo acontecendo, tem uma musa (Beatriz), além das discussões filosóficas, das cenas assustadoras, das piadas (veladas ou não). Poderia se fazer outra lista apenas com as qualidades do texto, mas é melhor esperar que “o Amor que move o Sol e as mais estrelas” seja capaz de comover o leitor por si só.
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Caso os sete pontos acima não tenham te convencido, vejam o vídeo da Anna Schermak, do Pausa para um café, provavelmente a maior fã do Dante e da Divina Comédia que conheço (afinal, não são todos que aprendem um idioma para ler um livro, certo?)
https://www.youtube.com/watch?v=iRE7elSKlAo