A vida a partir do Gato Preto, de Allan Poe

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Acredito que você já tenha ouvido falar sobre Edgar Allan Poe. Ele foi um escritor americano do século XIX, famoso por seus contos de terror, que já expressei aqui, não é um dos meus gêneros preferidos, mas…

Hoje, gostaria de falar sobre O Gato Preto, um conto apoiado em acontecimentos sobrenaturais. Poe tinha toda uma intenção quando resolveu colocar um gato preto em sua história. Por que não poderia ter sido um cachorro? Ou então por que ele não poderia ser pardo? Por que justamente um gato e por que preto? Quanto ao nome, por que Plutão e não qualquer outro que tanto vemos por aí? [Por exemplo, o nome do gatinho de meu aluno é Miséria].

Comecemos pelo clássico “era uma vez”.

Era uma vez um homem bondoso que se casou com uma mulher igualmente bondosa. O casal, que sempre gostou de animais, possuía vários bichinhos e, em especial, um gato preto chamado Plutão. Tempo vai, tempo vem, aquele homem começou a sustentar o vício do álcool, que tornou seu temperamento agressivo e abusivo. Certa noite ele chegou bêbado em casa e percebeu que Plutão estava evitando-o. Irritado, o homem puxou o gato, que o mordeu. Pegando um canivete, o homem arrancou um olho do pobre Plutão e, dias se passaram, o gato estava recuperado do ferimento, mas o homem estava com a consciência deteriorada. Numa tentativa de pôr um fim à sua culpa, ele passou um laço ao redor do pescoço de Plutão e o enforcou em uma árvore do jardim.

A vida daquele homem não foi mais a mesma. Um incêndio seguiu-se, consumindo toda a casa, exceto uma única parede, que ficou marcada com a imagem de um gato pendurado numa forca. Semanas depois o homem encontrou outro gato, parecido com Plutão, e decidiu adotá-lo numa tentativa de, talvez, se redimir pelo seu crime. Mas não demorou muito e o novo gatinho se tornou alvo da ira daquele homem.

A gota d’água foi quando, numa tentativa de agradar o dono, o gatinho passou entre as pernas do homem, quase o fazendo tropeçar. Novamente tomado pela fúria, o homem pegou um machado para matar o animal, mas a esposa o impediu. Tamanha fora a ousadia da mulher, o homem decidiu castigá-la e feriu o machado no crânio dela, matando-a sem remorso. Agora, algo precisava ser feito com o corpo…

Que tal você ler o conto do Poe e descobrir o final? Recontar é muito diferente de ler o original – e, preciso admitir, Edgar Allan Poe foi um grande escritor.

"The Black Cat" (1934), filme do diretor Bela Lugosi
“The Black Cat” (1934), filme do diretor Bela Lugosi

Respondendo as questões inicialmente propostas, eis uma análise literária (como o próprio termo já diz: análise – comentário avaliativo ou crítico que busca entender ou descrever alguma coisa; o que é diferente de eu concordar ou não com tais ideologias). Segundo o dicionário de símbolos de Chevalier, o gato é um animal relacionado à bruxaria; o preto simboliza as trevas; e Plutão era o “apelido” de Hades, que na mitologia grega é considerado o deus dos mortos. Michelli Regina Pohl tira uma conclusão disso tudo em seu artigo [Análise estrutural do conto O Gato Preto de Edgar Allan Poe]: “Uma resposta sugestiva de por que Poe teria escolhido o gato dentre tantos animais e dar-lhe o nome de Plutão, pode ser pelo fato de que ele queria trazer essa origem obscura do demônio e da força das trevas para seu conto…”. (Quem ler o conto, lembre que o ditado afirma que gatos possuem sete vidas! Será mais fácil compreender o final.)

Poe era fora da casinha, mas era um gênio quanto a estrutura de suas histórias, não?

Agora, um trecho de O Gato Preto que me chamou a atenção:

 “No entanto, não estou mais certo da existência da minha alma do que do fato que a perversidade é um dos impulsos primitivos do coração humano; uma dessas indivisas faculdades primárias, ou sentimentos, que deu uma direção ao caráter do homem.”

“…a perversidade é um dos impulsos primitivos do coração humano…” – eu pergunto: tá, e…? Novamente bato na mesma tecla: todos nós temos um lado bom e um ruim. Luz e trevas. Ao acordar, você decide se quer beber café ou chá. Decide se vai pegar um ônibus para o trabalho ou se vai caminhando. Decide se vai estourar com aquela pessoa ou se vai contar até dez e se acalmar. Decide se vai desistir ou se vai continuar…

Sabe aquela história de que ao nosso lado paira um anjinho e um diabinho e que cada um nos sopra pensamentos? A realidade é basicamente assim. Como fica óbvio, o homem do conto de Poe escutou o lado errado e acabou com sua própria vida. Pensamentos se transformam em atitudes e você é o que você faz.

Qual voz você vai decidir ouvir?

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