As dicas de Chimamanda Adichie para educar crianças feministas

0
As dicas de Chimamanda Adichie para educar crianças feministas

Em seu livro “Como educar crianças feministas”, Chimamanda Adichie nos dá valiosas dicas para formar uma geração mais consciente e crítica.

Foto divulgação

O desafio de educar uma criança

Acredito que se você pensa em ser pai ou mãe, o maior desafio a enfrentar seja a educação da criança. A educação é de responsabilidade dos pais. E, como se sabe, pais são aqueles que dão oportunidade, vida e dignidade a uma criança. São também os grandes responsáveis por todo o seu desenvolvimento.

Assim, em uma sociedade corrompida pelo “machismo estrutural”, onde simplesmente por ser “mulher” se sofre discriminação, educar uma menina ou um menino feminista é um grande desafio.

Sobre a autora e sua obra

Chimamanda Ngozi Adichie é uma escritora nigeriana e feminista. Sua escrita evidencia a luta por igualdades de gênero e também as tantas formas de desigualdades sociais. Ela é reconhecida como a mais importante escritora nigeriana e uma das mais importantes jovens autoras anglófonas de sucesso.

Em seu livro “Para educar crianças feministas“, dá dicas simples e precisas para uma formação equânime das crianças. Esse processo se iniciaria com uma justa distribuição de tarefas entre pais e mães.

A autora busca reflexões dentro do feminismo e acredita que a educação infantil é o primeiro passo para a construção de uma sociedade mais justa. O texto foi escrito como uma carta para sua amiga, que acabara de se tornar mãe de uma linda menina, a Chizalum.

A independência feminina

Segundo Chimamanda, as mulheres precisam se sentir completas, buscar e batalhar por seus espaços no mercado de trabalho, seja quais forem suas formas de realização. Com isso, ressalta a importância de não abandonarem seus objetivos profissionais para dedicarem-se apenas à maternidade:

Por favor, não acredite na ideia de que maternidade e trabalho são mutuamente excludentes”.

Um grande tabu na educação de filhos diz respeito às atividades domésticas. Esta é, na maior parte das vezes, destinada às mulheres. Chimamanda deixa claro que as atividades devem ser compartilhadas, pois assim Chizalum e outras crianças poderão ter, desde cedo, boas referências.

“O trabalho de cuidar da casa e dos filhos não deveria ter gênero, e o que devemos perguntar não é se uma mulher consegue “dar conta de tudo”, e sim qual é a melhor maneira de apoiar o casal em suas duplas obrigações no emprego e no lar”.

É que a educação de uma criança é também sua construção e formação, pois sabemos que os primeiros anos são decisivos para a vida. Por isso a importância dos pais realizarem as funções juntos, dividindo tarefas para que ambos possam contribuir na educação dos filhos.

Os papéis de gênero

E quando ouvimos falar: isso é “coisa de menino”, isso é “coisa de menina”? Quem nunca ouviu? Nosso país tem até uma “ministra” que fala isso! Então, a autora deixa claro que “papéis de gênero” são totalmente absurdos.

“Nunca lhe diga pra fazer ou deixar de fazer alguma coisa ‘porque você é menina’.[…] Lembro que me diziam quando eu era criança para ‘varrer direito, como uma menina’. O que significava que varrer tinha a ver com ser mulher. Eu preferia que tivessem dito apenas para ‘varrer direito, pois assim vai limpar melhor o chão’. E preferia que tivessem dito a mesma coisa para os meus irmãos”.

Comumente encontramos situações como a relatada pela autora. Isso ocorre porque as gerações passadas tiveram os ensinamentos baseados na mulher como a responsável pela casa e filhos e o homem como provedor do sustento familiar, algo tão sexista e excludente. E quem nunca ouviu que “cozinha é lugar de mulher”? A autora também deixa clara sua posição sobre isso:

“Saber cozinhar não é algo que vem pré-instalado na vagina. Cozinhar se aprende. Cozinhar – o serviço doméstico em geral – é uma habilidade que se adquire na vida, e que teoricamente homens e mulheres deveriam ter”.

Papéis de gênero são incentivados pela sociedade desde cedo. Quando vamos em uma loja de brinquedos fica claro que bonecas são destinadas às meninas como uma preparação para ser mãe, enquanto que para os meninos estão as bolas ou os carrinhos, por exemplo. Numa loja de roupas, o setor infantil feminino sempre vai ter o rosa e o do menino, o azul.

Isso é totalmente excludente e arcaico. É evidente até nas escolas, onde vemos muitos educadores que tratam meninas como pessoas “mais frágeis” e os meninos como os “mais fortes”. Precisamos educar as crianças para serem livres nas suas escolas. Para tal, é preciso deixar de lado qualquer estereótipo sexista.

O casamento como uma realização

Chimamanda reflete que “um casamento pode ser feliz, ou infeliz, mas não é realização”. Uma mulher não precisa ser boazinha ou viver sua vida tentando agradar os demais. O que devemos ensinar às crianças é a honestidade, e que construam uma identidade sempre agindo com sinceridade.

A autora diz mais:

“Ensine-lhe que ela não é apenas um objeto de que gostam ou desgostam, ela também é sujeito que pode gostar ou desgostar”.

A autora fala da importância da identidade e critica os modelos tradicionais, onde as grandes referências são pessoas brancas e ricas. Ela também fala da valorização da identidade negra e africana, sobre heróis e heroínas negros na história.

A questão da beleza

Vemos muitas mulheres preocupadas com a beleza do corpo, e isso é notório desde a infância. Mas, além da beleza, uma menina precisa cuidar da saúde. Por isso é fundamental a prática de esportes, e não só a ginástica, dança ou vôlei, qualquer esporte que desejar.

É comum pensamos que a mulher feminista não se preocupa com sua beleza. Sobre isso, Chimamanda deixa claro: “Não pense que criá-la como feminista significa obrigá-la a rejeitar a feminilidade. Feminismo e feminilidade não são mutuamente excludentes”.

É comum a sociedade pré-julgar uma mulher pela forma da vestimenta. Ainda ouvimos o termo “puta”, ou pior ainda “mereceu ser abusada”, tudo pela forma que a mulher se veste. A autora deixa claro para ensinar à bebê que “roupas não têm absolutamente nada a ver com a moral”.

Falando sobre sexo

Outro grande tabu na criação dos filhos é falar sobre sexo. Infelizmente as famílias não conversam sobre o tema e as crianças não possuem segurança para questionar.

A autora deixa clara a importância não só de falar, mas falar desde cedo. É melhor para que haja uma educação sexual e que se veja o sexo como algo natural e prazeroso ao ser humano, não somente como agente de reprodução ou algo para ser consumado após o casamento.

Chimamanda, numa de suas últimas dicas, diz para a amiga ser uma mãe com quem Chizalu possa falar de tudo. Como é importante ter essa abertura e falar sobre uma relação amorosa, rotinas na escola, até mesmo sobre sexo!

É comum ouvirmos que a mulher conseguiu um “bom casamento”. Como se o casamento fosse uma conquista para ela. Ou até mesmo que a mulher não precisa trabalhar, que isso é tarefa exclusiva do homem. A autora esclarece: “Ensine-lhe que não é papel do homem prover. Num relacionamento sadio, prover é papel de quem tem condições de prover”.

A importância de conviver com as diferenças

E, para encerrar as dicas, a autora traz o ensinamento da diferença. Toda diferença é algo comum e que precisa ser respeitada, “a humildade traz a percepção de que a diferença é normal”.

“Diga-lhe que algumas pessoas são homossexuais e outras não. Uma criança tem dois pais ou duas mães porque é assim que algumas pessoas fazem. Diga-lhe que algumas pessoas vão à mesquita, outras à igreja […]”.

Do manifesto para a vida

O livro Para educar crianças feministas, de Chimamanda Ngozi Adichie, deveria ser lido e entendido tanto por mães quanto por pais. A autora traz a importância do aprendizado das crianças.

Essa geração pode salvar nossa sociedade, pois é muito mais fácil ensinarmos aos mais novos do que mudarmos o machismo estrutural que vivenciamos com os mais velhos.

Falar de feminismo é preciso! Ainda vemos uma grande desigualdade de gênero. Há mulheres que trabalham mais, são mais qualificadas e recebem menos para exercer os mesmos cargos que homens.

Em dias de pandemia, percebemos que a incidência da violência e abuso contra as mulheres têm sido muito mais frequentes. É vergonhoso perceber que o ser humano não evoluiu para a coletividade.

Para quem gostou da temática, a própria autora tem outro livro Sejamos todos feministas que é uma ótima dica de leitura. Que mais mulheres possam se inspirar na Amélia desconstruída da Pitty e buscar o novo, a libertação!

Referência

ADICHIE, Chimamanda Ngozi. Para educar crianças feministas. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.

Não há posts para exibir