Então, ele se foi. Assim. De repente. Já estava em tempo. Só que não era assim que deveria ser.
Nos primeiros dias, eu achei até bom. Reorganizei a casa, refiz minha rotina. Redescobri o prazer da solidão. Eu me senti livre, leve! Mas, depois, fui dominada pelos porquês. E aquele gosto de reflexão enferrujada tirou meu paladar alegre. Ir embora desse jeito, sem avisar, sem deixar um bilhete, sem dar a mínima satisfação! Não que eu não conhecesse os motivos. Simplesmente não custava nada olhar na minha cara e dizer: “Eu estou deixando você”. Não. Nem coragem para isso ele teve. Era um fraco.
Talvez estivesse com medo da minha reação. O que eu diria? “Já vai tarde”. “Isso! Vá embora! Desista de mim, desista de tudo. Você é um covarde mesmo!”. “Você já me abandonou há muito tempo”. “Vai com Deus”. “Tchau”.
Ultimamente, ele só conseguia me irritar. Tudo que ele fazia me incomodava, até a presença dele me deixava nervosa! Ele era um fraco, um imbecil, fracassado, incapaz, insensível! E eu dizia, gritava tudo isso para ele, que ficava me olhando como um cão que levou bronca da dona. Essa apatia piorava o meu estresse. Pelo amor de Deus, por que ele não reagia?! Por que não gritava de volta, não revidava, não se defendia? Era um fraco. Eu tinha vontade de pisar nele, espezinhá-lo, provocá-lo até o limite. Foi o que aconteceu. Um dia, ele se cansou, como eu já estava cansada.
Claro, tinha que acabar. Nosso relacionamento já havia naufragado. Mas eu esperava poder pôr um ponto final decente na nossa história. Nem para ir embora ele teve peito para me enfrentar. Nem para me deixar ele teve argumentos. Era um fraco. Sempre foi. Eu que fui idiota por não perceber antes.
Agora, não sei o que fazer. Estou atormentada pelos porquês. Eu só gostaria que ele me falasse o motivo. Mesmo que, no fundo, eu já soubesse. Eu gostaria que ele me dissesse. Eu queria que ele me enfrentasse e jogasse as coisas na minha cara. Sim, eu lhe daria esse direito. Eu só o humilhava porque ele não se defendia. Eu estava esperando uma reação. Não foi a reação que eu esperava.
Não é saudade. É orgulho, posse, vaidade, mágoa, culpa. Não é saudade. É outra coisa. Não é saudade.
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Ilustração exclusiva para o conto por Giovana Christ.