Fazia muito tempo que o choro não lhe incomodava, não se fazia presente, mas naquele dia, depois de uma taça de vinho e a expectativa de vê-lo novamente. Depois que as horas passaram lentamente no relógio, depois de adormecer e acordar no mesmo sofá, de ter sobre seus joelhos a manta, que um dia abrigou os sonhos divididos, depois de subir as escadas em direção ao quarto, depois de desistir da camisola de seda e optar pela velha camiseta de malha, sentou sobre os lençóis recentemente trocados e chorou.
Não chorou pela noite tão bem planejada que agora parecia perdida, mas pelos anos que perdeu antes daquela noite. Chorou pelos sonhos não vividos, pelas vezes que deixou de fazer algo que desejava para estar ao seu lado, pelos cafés da manhã nunca compartilhados.
Chorou pela certeza do que, apesar de óbvio aos outros olhos, lhe parecia tão impossível. Chorou por ter levado tanto tempo para entender.
Não havia mais amigas para ligar em uma hora como aquela, não quando todas as suas amigas acharam o fato de envolver-se com ele tão ultrajante… Mas elas não entendiam…
A família também já estava distante e as últimas palavras do pai foram “isto é uma vergonha!”
Ela nunca tinha se sentido envergonhada por amar, mas sentia-se naquele momento. Vergonha não pelo sentimento, mas pela situação a que foi levada a viver.
E a descoberta que a princípio era aterradora, foi tornando-se mais leve, como se as lágrimas empurrassem para longe o sentimento ruim, enquanto outro se acendia. Sentiu-se liberta pera jogar no lixo as coisas que lhe lembravam de sua história, deixando apenas o bilhete no espelho que lhe desejava um bom dia, mas parecia apenas mais uma desculpa. Ele ficaria ali como uma lembrança do que não deveria suportar.
Seus olhos passaram do bilhete ao reflexo que a observava com olhos grandes e vermelhos.
Aquela era uma história de amor, uma história que não seria dividida, mas vivida. Seu coração bateu um pouco mais forte, um sorriso que a muito tempo não via, se desenhou em seu rosto e ela se viu, pela primeira vez, apaixonada pela pessoa que o espelho lhe revelava.