Dom Casmurro, de Machado de Assis

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O ano do vestibular é repleto de tensões. Horas de estudo, conteúdos densos e extensos e, normalmente, poucos alunos têm tempo de se dedicarem à Literatura, que nas provas de admissão para as universidades brasileiras aparece de forma pouco específica, exigindo então do vestibulando um bom conhecimento dos períodos literários e suas principais obras a fim de buscar uma contextualização coerente ao tempo em que vivemos atualmente. Com isso, a equipe do HomoLiteratus inaugura uma série de matérias sobre as obras literárias que apareceram (e provavelmente aparecerão) nos vestibulares que ocorrem por todo o Brasil, incluindo o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio).

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dom-casmurro-machado-de-assis Nada mais justo do que começar com uma das obras-primas da literatura brasileira: o grande clássico Dom Casmurro, de Machado de Assis. O enredo proposto pelo autor consiste no retrato de uma incrível e envolvente história de amor entre Capitu e Bentinho. Desde a infância, eles mostram uma afinidade ímpar entre si que, associada à denúncia amorosa de José Dias, traça o início de um amor que vai amadurecendo conforme cada personagem cresce individualmente e como casal. O amor juvenil é interrompido pela mãe de Bentinho, Dona Glória, que insiste em colocar o filho no seminário de formação eclesiástica como forma de pagamento de uma antiga promessa feita à Deus. Nesse distanciamento entre Bento Santiago e Capitu surge então a terceira e tempestuosa personagem, Escobar, que aproxima-se de forma avassaladora de Bentinho e assim dá início à uma grande amizade. Da convivência entre as três personagens, nasce a pintura de palavras machadiana que até os dias atuais divide opiniões e conquista fãs de todas as idades. A atemporalidade da história encontra-se na temática. Falar de adultério e seus contornos polêmicos ainda é bastante comum em nossa sociedade, mesmo que estejamos cerca de 200 anos distantes da obra. O toque inovador, porém, dá-se a partir da criação de uma personagem feminina com a força e determinação de Capitu em tempos em que a mulher vivia em uma grande submissão em relação à sociedade. Houve um impacto considerável no corpo leitor da época, acostumado com seus heróis masculinos, e, mais do que isso: sempre perfeitos, cordiais e equilibrados. Dom Casmurro alertou a sociedade do século XIX para os aspectos inerentes a cada indivíduo e que estavam adormecidos. Para melhor entender a magnitude da obra, é importante situar Machado nos períodos literários. Apesar de ser o maior representante do Realismo brasileiro, o autor escreveu alguns romances bem no início de sua carreira, que são enquadrados no romantismo. Neles, a temática se aproximava com os ideais reproduzidos nas histórias de José de Alencar e seus romances urbanos, que tinham como público-alvo a burguesia e, principalmente, as filhas dos comerciantes que sonhavam com amores como os descritos nos livros que seus pretendentes liam. Com a chegada à maturidade, Machado passou a se dedicar aos aspectos táteis do mundo em que vivia, retratando então personagens que tinham características bastante humanizadas em vez de idealizadas. A mudança porém, não foi tão bem aceita. A burguesia ainda não estava preparada para receber tal crítica social e, com isso, destinou alguns olhares tortos ao autor.

Capitu traiu Bentinho? Uma das maiores dúvidas da literatura brasileira

A questão central da história, como já dito previamente, está na traição. Bentinho vê sua insegurança aflorar com o passar dos anos e a peraltice de Capitu crescer junto com seus atributos físicos. A situação ganha um agravante quando o amigo Escobar é apresentado à mulher. Desse dia em diante, Bento Santiago perde o sossego e passa a crer em uma aliança amorosa entre seu melhor amigo e sua amada. A desconfiança chega ao máximo, o que nos leva a questionar se tudo aquilo era um universo arquitetado na mente do personagem principal ou cada uma daquelas hipóteses algum dia se confirmou. Esta lançada então uma das maiores dúvidas de nossa literatura: Capitu traiu Bentinho? A resposta nem parece importar mais, afinal nunca saberemos nem se há ou se um dia houve alguma na mente genial de Machado de Assis.

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