A história de como Kafka quase enriqueceu e outras curiosidades estão no livro Is that Kafka? 99 Finds, de Reiner Stach, um dos mais importantes biógrafos do escritor tcheco
Franz Kafka não chegou a ser paupérrimo, mas, como a maioria dos escritores, obviamente, teve seus momentos de dificuldades financeiras, principalmente no final da vida, em decorrência de sérios problemas de saúde. Mas, em 1911, durante uma viagem entre Lugano e Milão, na Itália, teve um estalo: criar um guia de viagens diferente de todos os que circulavam à época. O diferencial era algo que parece comum nos dias de hoje, mas, segundo o autor e parceiro na empreitada, Max Brod, era algo que iria revolucionar esse tipo de publicação – era um guia de como viajar barato.
Sob o título guarda-chuva de On the cheap, a ideia era lançar vários filhotes – Viaje barato pela Itália, Suíça, Paris, Spas da região da Bohemia e Praga. Os dois parceiros chegaram a desenvolver um audacioso plano de negócios para alcançar sucesso, de acordo com o texto abaixo, em tradução livre:
O desafio:
Nossa era democrática já permite a todos condições fáceis e universais de viagens, mas as maneiras de fazê-lo não são divulgadas. Nosso desafio é coletar essas informações e torná-las conhecidas de forma sistemática (…) Mas o que On the cheap significa – Muitas nuances. Nós distinguimos hotéis palacianos dos vulgares (…) Por receber informações pobres, os viajantes acabam gastando muito em suas viagens. Queremos oferecer informações sobre os destinos adequadas para as temporadas de férias de verão, incluindo, possivelmente, os custos com transportes e reputação dos países e regiões visitadas (…) O mesmo prazer com menos dinheiro.
O texto discorre ainda sobre outras dicas a serem oferecidas nos guias – desde locais para a compra de souvenirs, roupas, assim como a presença de cassinos, além da disponibilidade de mapas das cidades. E o mais interessante: os livros iriam sugerir cerca de 200 palavras nos idiomas locais, já que, para os idealizadores, seria impossível aprender muito depressa qualquer que fosse o idioma. As publicações iriam prometer então “O mais importante sobre os dialetos suíços” ou algo bem engraçado: como interpretar “os gestos de mãos dos italianos”.
Mas a demora na produção e problemas nas negociações com editores levaram o projeto ao fracasso. De tão revolucionário, não chegou a ser compreendido pelas editoras da época e os autores pouco explicaram sobre os livros, temendo serem copiados.
Mas as ideias de Kafka não pararam por aí. Apesar de ser tímido e de poucas interações sociais, o escritor sempre foi fascinado por dispositivos que permitissem que as pessoas se comunicassem mais e melhor. Até que, em 1913, o autor inventou uma engenhoca que chamou de parlógrafo. O invento era uma mistura de telefone e gramofone, pois o usuário teria que girar um mecanismo para falar e ditar o que seria gravado. Para Kafka, era um excelente equipamento para jornais, revistas e agências de notícias e para si mesmo, pois permitia que quem fosse usar pudesse se preparar antes. Como era muito tímido, Kafka acreditava que facilitaria a comunicação de pessoas como ele, que tinha grandes dificuldades para usar um telefone e falar em tempo real.
Segundo ele, sua noiva, Felice Bauer, seria a melhor pessoa a ser responsável pelo marketing. Isso porque ela trabalhava em Berlim no escritório de Carl Lindström AG, a fabricante alemã que ficou encarregada pela produção. Felice chegou a aparecer em um dos anúncios do produto, demonstrando o uso da máquina.
Porém, eles jamais ganharam um centavo de lucro com a produção do parlógrafo. Isso porque maquinário semelhante já havia sido criado e patenteado pelo engenheiro Ernest O. Kumberg, como o nome de telenógrafo, em 1900, na Dinamarca. Apesar disso, o aparelho dinamarquês nunca teve grande popularidade.
Para saber mais sobre o fascinante mundo kafkiano:
Is that Kafka? 99 Finds – Reiner Stach – New Directions