“Após ler O centauro no jardim, do Moacyr Scliar ficou com um gosto amargo na boca. Não gosta do centauro. .. não gosta de quem não sabe o que quer (mas ele sabia tanto!) Não… na verdade, não gosta do atrevimento do centauro. Ou da coragem? Fica imaginando como é que ele pode desejar andar em duas pernas quando poderia andar em quatro, tão mais firme! Se pergunta porque ele decidiu ficar sem um apoio tão importante…o desequilíbrio não é um bom caminho, pensa. Essa sensação de ser dois e de querer ser um a angustia profundamente. Ela é um centauro também… tem uma natureza diferente, sente-se diferente, mas precisa adaptar-se aos moldes impostos pelo contexto em que vive. Ela é gente em sociedade e centauro quando está sozinha. Durante o dia precisa andar sobre as duas pernas, mas o corpo todo geme por liberdade. Precisa sufocar um grito que está saindo pela garganta. Precisa decidir ser mulher ou ser centauro (como se isso fosse possível). Mas quer ser as duas coisas. Quer ter a liberdade de transitar pelos dois mundos…Ela entende o centauro: como foi difícil submeter-se a uma natureza que não era a sua, sofrer para ser igual aos outros, mas na essência era centauro, pensava como centauro, acreditava como centauro. Ela não gosta do centauro. Quem sabe ele se arrepende? Eu não te disse que tu precisas ser tu mesmo, independente do que te dizem? Mas isso não é verdade. Não pode ser verdade. Porque a vida exige um comportamento padrão. Não há escolha. É preciso retaliar-se e mutilar-se de vez em quando, para caber no molde. Ela sabe o quanto custa abrir mão de sua verdadeira natureza. Mas isso ninguém entenderia!