Estar com a esposa era tudo que Dagoberto queria. Os finais de semana eram esperados com um toque de nostalgia. Imagina então ficar sete dias em casa? E foram, exatamente, sete dias que ele conseguiu com o seu chefe, logo após o carnaval. Seria um sossego sem igual.
Dagoberto já fazia planos. Quem sabe uma pequena viagem, uma escapadinha para o campo? Ou então, uns dias na praia? Ai… Ai… Planos e mais planos. Seria uma espécie de segunda lua de mel. A esposa adoraria! Antes de ir para a casa, Dagoberto, como um bom marido, passa numa loja de chocolates e compra uma linda caixa de bombons e depois, para demonstrar todo o seu lado romântico, vai até a floricultura e compra um lindo buquê de flores do campo. Lindas flores. Lindas como a sua esposa.
Ao chegar em frente ao seu prédio, todo contente, com um sorriso que ia de orelha a orelha, Dagoberto lembra-se que trabalhou o dia inteiro e pensou cá com os seus botões: “O desodorante já deve estar vencido”. Ele não queria abraçar a sua esposa cheirando a papéis, computadores e escritório. Um andar abaixo do seu apartamento ele saiu do elevador e foi até o apto de seu amigo Luís. Assim que o amigo abriu a porta ele foi logo dizendo:
– Me vê aí um desodorante!
– Quê?!
– Um desodorante. Não posso chegar em casa assim, com cheiro de…
– Ah, sei, sei. Você andou aprontando, não é? – diz o amigo após ver nas mãos de Dagoberto as flores e a caixa de bombom.
– Quem, eu? – olha para as flores e os bombons em suas mãos – Ah, não! Não é o que você está pensando. Quero apenas…
– Não precisa explicar, amigo. Sou homem e sei muito bem o que é isso. Mas pra que o desodorante?
– Tô com o cheiro lá do…
– Bah, e lá é tudo perfumado. Os lençóis, os travesseiros, os ‘sabonetinhos’…
Dagoberto nem quis perder tempo e dizer que o cheiro que ele falava era do escritório. Já estava atrasado, queria apenas o desodorante.
– Tá, tá, me dá logo o desodorante pra cá.
– Bah, cara. Eu estava agorinha mesmo indo ao super comprar um, o meu também terminou.
– Terminou?! – pergunta com tom de desespero e tristeza. – E agora?!
– Bem, se você me esperar aqui, já volto com um desodorante. Vou rapidinho ali na farmácia e compro.
– Não, não, é muito tempo.
– Ou…
– Ou?!
– A minha mãe esteve aqui ontem dando uma geral na casa e esqueceu o dela aqui. Pode ser?
– O desodorante da sua mãe? E é bom?
– Poxa, sei lá. Desodorante de velho é tudo igual. Tudo com cheiro de pó guardado com naftalina.
Dagoberto pensa um pouco. Precisava pensar rápido. Já havia passado uma hora do seu horário normal de chegar em casa. Desodorante da velha. Que mal poderia fazer? Pior do que estava não ficaria.
– Dá lá o desodorante da tua mãe.
Luís alcança o desodorante da mãe para o amigo que resolve passar no corpo todo. Ele nem percebe o cheiro do desodorante. Em seguida, vai até a porta com a intenção de ir embora, mas volta para o amigo e diz:
– Preciso ir ao banheiro, amigo.
– Quer tomar um banho?
– Não! Tirar uma “água” do joelho, mais nada.
– É por ali.
Dagoberto, suspira aliviado. Uma hora trancado no trânsito e agora, todos aqueles minutos ali no apartamento do amigo, não iria aguentar até em casa. De repente, ao puxar, pela terceira vez o fecho da calça, percebe que a praga estragou. Não fecha! E agora?! Melhor colocar a camisa para fora das calças. Será que a esposa estranharia? Estava sempre tão arrumado. Terno, gravata e camisa sempre tão alinhados. Ah, com aquelas flores e os bombons ela nem perceberia.
Saiu do banheiro e foi para a porta.
– Estou indo, Luís. Obrigado pelo desodorante.
– Ok.
Ao chegar em casa, duas horas atrasado, a esposa o espera com ódio nos olhos.
– Oi, amor. Olha o que eu trouxe para você! – dizendo isto, ele entrega as flores e os bombons.
– Canalha! Bem que a minha mãe me disse que você não prestava! – olha para as calças abertas do marido. – Tá pensando o quê? Que vem assim – aponta para as calças – e acha que me compra com essas flores do mato? E esta caixa de bombom é pra quê? Para eu engordar?
Dagoberto tenta explicar a situação, mas o jacaré morre pela boca e ele mesmo deu o tiro mortal em suas pequenas férias:
– Amor, não é nada disso, pode ver, eu estava no escritório. Você sabe que lá só tem velho, sinta só o cheiro da ‘velharada’ em mim!
A mulher chegou perto e aspirou aquele cheiro. Baita cara de pau!!!
Depois disso, voou as flores, a caixa de bombom e todos os palavrões possíveis do sétimo andar.
Luís, ao ver passar caindo pela sua janela aqueles objetos já imagina o que foi que aconteceu e o porquê, também. Vira-se para a mesa e pega o frasco do “desodorante” da sua mamãe. Um legítimo uísque do boteco de Seu Amaro preenchia o lugar do desodorante.
Até o nosso próximo Intervalo.