Mitologia: Eros e Psiqué (parte 04) – Sté Spengler

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Parte 04: A revelação de Eros

Naquela mesma noite em que as irmãs deixaram Psiqué, Eros novamente pediu que a esposa tomasse cuidado – a felicidade deles estava ameaçada e ele não queria perdê-la.

– Já lhe falei que nunca mais me verás se tentares descobrir quem sou.

– Mas por que todo esse mistério? Queria tanto olhar em seus olhos…

Eros abraçou a esposa e beijou-lhe a testa, trazendo-a para mais perto de si, acolhendo-a.

– Sabe de uma coisa? Você será mãe, minha querida Psiqué. E se você guardar o nosso segredo, nosso bebê será um deus. Mas se não guardar, será apenas uma criança mortal.

Psiqué exultou diante da ideia de carregar uma criança em seu ventre. Desde pequena sempre observava as crianças menores e imaginava como seria o dia em que fosse mãe. Um sonho cujas raízes estavam fincadas em sua infância e que agora era visto germinando.

A princesa passou o dia inteiro cantarolando pelos jardins do palácio e fazendo planos para o bebê que estava a caminho. Ela contou a novidade para os servos – as Vozes que eram suas únicas companhias –, no entanto, sentia desejo de poder compartilhar a notícia com sua família.

Quando a noite caiu, novamente o esposo advertiu Psiqué para que tomasse cuidado com as irmãs e pediu-lhe que não mais as recebesse no castelo. Porém, ela o persuadiu com beijos e palavras doces – “Por favor, deixe-me compartilhar essa alegria com minhas irmãs.”

O jovem e apaixonado casal dormiu entrelaçado e ao nascer do sol, sozinha, Psiqué levantou-se para organizar a chegada das irmãs.

Elas pareciam agitadas logo que adentraram as portas do palácio.

Psiqué contou-lhes que seria mãe e as irmãs, em fingida alegria, parabenizaram-na. No entanto, as mesmas perguntas logo vieram – elas queriam saber a todo custo quem era o marido da irmã. Inocente, a princesa respondeu-lhes, mas acabou caindo em contradição com o que respondera anteriormente. Era óbvio: ou Psiqué estava mentindo ou ignorava a aparência do marido.

Chegara a hora de as duas irmãs colocarem o plano em ação.

– Irmãzinha, você lembra que foi levada até o monte para unir-se a um terrível monstro? E se esse seu marido for a tal serpente que o Oráculo previu?

– Ao cair do sol, os camponeses e caçadores têm visto uma serpente enorme atravessando o rio em direção ao seu palácio. – a outra acrescentou.

O coração de Psiqué batia descompassado, o medo dominando-a.

– Esse monstro deve estar esperando o momento oportuno para devorá-la. Você e o seu bebê.

Desesperada, Psiqué confessou-lhes que jamais havia contemplado o marido à luz do dia e implorou que as irmãs a ajudassem.

– Pegue um punhal afiado e um candeeiro. Quando ele estiver dormindo, ilumine o rosto dessa besta e corte-lhe a cabeça fora. – foi o conselho recebido.

A princesa tomou a arma nas mãos trêmulas e engoliu em seco. Precisava fazer aquilo para salvar a si mesma e ao seu bebê.

Um terremoto de conflitos tomou conta de Psiqué – ela lembrou-se do calor dos braços de seu amado e das tantas advertências que ele fez sobre aquele momento; lembrou-se também da árdua jornada do palácio de seu pai rumo ao monte em que seria sacrificada. Num mesmo coração, o ódio pelo monstro e o amor pelo marido pintavam o cenário daquela alma confusa.

À noite, Eros adormeceu ao seu lado, e reunindo toda coragem que possuía, Psiqué ergueu o candeeiro para contemplar o rosto do esposo. Foi então que viu a mais bela criatura – o próprio deus do amor impecavelmente esculpido diante de si. Atormentada pelo que estava prestes a fazer, ela tremeu e caiu de joelhos, contemplando embevecida o seu amado. Viu também, ao lado da cama, as flechas do deus, e ao tocá-las, feriu-se. Estava decretado: aquele amor agora seria eterno.

Ela aproximou-se e começou a beijá-lo desesperadamente, como se sua vida dependesse daquilo, e em seu agito, esqueceu-se do candeeiro, deixando uma gota de óleo quente cair sobre o peito de Eros. Num sobressalto ele despertou, olhou profundamente desapontado nos olhos da esposa, e sem dizer uma única palavra abriu suas asas e partiu.

Psiqué segurou-lhe a perna direita e atravessou algumas nuvens junto a ele, mas o cansaço a dominou e a princesa caiu, sendo acolhida pelo vento Zéfiro e aterrissando suavemente sobre a relva.

– Não vá… – implorou, enquanto via o vulto do marido desaparecer entre as estrelas.

[continua…]

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