Um dos grandes problemas de alguém que quer publicar seu(s) primeiro(s) livro(s) é, provavelmente, não conhecer bem o mercado editorial. E, claro, o fato de esse desconhecimento ser recíproco. Sei que muitos pensam que o importante é a escrita, mas a publicação, no fim das contas, depende mais da editora do que do escritor, portanto, saber um pouco melhor como esses jogos funcionam sempre ajuda. Até porque mesmo que hoje publicar seja muito fácil, o problema da distribuição e da circulação continuam difíceis de se resolver. Então, aqui vão algumas dicas que podem ajudar a quem almeja esse tipo de publicação. Lembrando que não há receita mágica: cada escritor tem seu caminho, e ele é, muitas vezes, imprevisível.
1) Não pense na publicação de seu livro como um fim, mas como um começo. Fiz questão de colocar isso como título, pois acho que é uma das ideias primordiais. Não trate o objetivo de ser publicado como a missão definitiva. Fazer isso pode levar você a encarar a publicação como um sonho distante (cuja realização não é algo que dependa também de você) ou como algo que não importa como, se for feito está bom. Não, não. Antes de sair por aí investindo em qualquer forma de ter seu livro impresso em centenas de exemplares com capinha bonitinha, pense que isso é só o começo. O mais complicado ainda é fazer com que seu livro chegue nos leitores, na imprensa, nos prêmios… (isso é um problema mesmo para quem publica por grandes editoras, não se iluda pensando que tem soluções fáceis para resolver essa questão).
2) Tente olhar as coisas “de fora da sua cabeça”. O seu livro é muito especial para você. A grande questão é: ele não é especial pra mais ninguém. Como fazê-lo ser? Por isso dependemos da circulação. É bom que seu livro seja conhecido, comentado, criticado e tudo o mais, e por várias pessoas. Se forem pessoas importantes, então, melhor ainda. O mercado editorial é muito pequeno e, basicamente, quase todo mundo sabe quem quase todo mundo é. Use isso a seu favor. Lembre-se de que você, para os outros, é mais um. Assim, não se deixe enganar ou cair em uma situação confortável de pensar em si mesmo como o grande escritor que ninguém conhece, o injustiçado. Isso não ajuda em nada. Tente crescer, virar o jogo.
3) Não superestime a internet. A internet é uma ferramenta poderosa, fascinante. Mas ela também é muito ilusória, cuidado. Não pense que se fizer um blog pra colocar seus textos lá, você já tem grande chance de sucesso. Aliás, não confunda alguns views, “curtidas” e comentários com grande prestígio; tente manter em foco a verdadeira dimensão das coisas. Pense em quantos blogs têm por aí que você nunca ouviu falar (isso porque você é uma pessoa ligada nessas coisas, imagina se não fosse). Tampouco pense que disponibilizar seu livro à venda ou pra download (ainda que gratuito) vai atrair muitas pessoas facilmente. A internet cria um outro problema para o livro chegar às pessoas: se nas livrarias físicas é quase impossível conseguir por conta própria que seu livro esteja nas prateleiras, a rede é como uma prateleira infinita, na qual milhões de coisas disputam a atenção do leitor. Por que, em meio a tudo isso, ele pegaria logo o seu volume? É preciso encontrar maneiras mais eficientes de atrair atenção, e aqui vão algumas dicas:
4) Tente dar mais do que receber. Pois é, o momento cristão ou hippie dessas dicas. Pare de esperar receber atenção dos outros e pense no que você pode oferecer que interesse a leitores, escritores ou editores. Você vai ter muito mais chances de conseguir estabelecer boas relações se, ao invés de ficar insistindo pra que todo mundo leia ou publique seu trabalho, você puder oferecer algo interessante (e não estamos falando da sua incrível história). É só pensar o inverso: quem você prefere, as pessoas que exigem algo de você ou as que te dão algo que lhe interessa? Pra quem você vai dar mais atenção? Tente pensar em iniciativas como um blog com resenhas, entrevistas etc. Garanto que você vai conseguir, assim, mais do que imagina. Vai ter escritores dispostos a conversar com você, editoras talvez lhe dando livros, convites para eventos, etc. etc. Isso é uma bela maneira de adentrar o meio, conhecendo-o melhor e se fazendo mais notado.
5) Falando em estabelecer relações, um dos conselhos mais importantes: Não seja um chato. Já temos o bastante disso, obrigado. Choramingar suas desilusões só vai fazer com que a chance de alguém te respeitar desapareçam; pressionar pessoas do meio a satisfazer suas vontades só vai afastá-las de você. E lembre-se: não há nenhuma citação de escritor repetida por aí que seja uma birrazinha; isso porque ninguém gosta disso.
6) Considere seriamente editoras menores. Eu odeio ser o portador de más notícias, mas se você não é uma celebridade (ou ao menos uma semi-celebridade), não escreve pra nenhum grande jornal nem conhece muito bem ninguém do meio, a chance de uma grande editora publicar seu livro é praticamente nula. Pois é. Apesar de você ser esse cara genial que sabe que é. Então repito: considere seriamente editoras menores. E com isso eu quero dizer não somente que você deve pensar nelas como uma alternativa, mas também deve examiná-las pra saber qual é a melhor escolha. Muita gente erra ao pensar que as editoras pequenas são todas iguais, que qualquer uma que imprima seu livro e coloque para vender está bom. Aí acabam selecionando a mais barata, a que tem sede na própria cidade ou por qualquer outro motivo de ordem prática. Não caia nesse erro. Pesquise bastante cada uma das editoras antes de escolher: veja como elas trabalham a distribuição e circulação dos livros (isso é muito importante!), veja o que acontece com os autores que publicam por ela (a maioria consegue publicações por editoras maiores depois? Ganham prêmios? Ou simplesmente não saem do lugar?), veja seu desempenho em prêmios (se os livros dessa editora entram em listas de finalistas ou mesmo vencedores do Jabuti, do SP, etc.) e tente conhecer o quanto puder dos editores – quem são, como são vistos no mercado, o quanto se dedicam. Principalmente no caso de editoras menores, o papel desses profissionais faz uma enorme diferença! Também aproveite a internet para entrar em contato com os autores publicados por essas editoras, ver o que eles acharam da experiência. Quanto mais informações tiver, melhor. Isso pode fazer uma enorme diferença na sua carreira. No último Prêmio SP, ganharam dois autores de editoras pequenas e isso representou uma reviravolta na carreira deles.
7) Participe de oficinas e eventos literários. Quem mora nos grandes centros tem melhor chances aqui, mas sempre é possível pensar em alternativas. Cursar uma oficina de escrita, ir a uma palestra ou a um bate-papo com um autor, ou fazer um curso online são coisas que podem aproximar você do mercado. Além de aprimorar sua escrita, você pode conhecer pessoas (como os professores, por exemplo, que na maior parte são escritores reconhecidos) que compreendem melhor o mercado e podem te dar dicas. Podem ajudá-lo a entender melhor como as coisas funcionam, ou mesmo te manter bem informado sobre eventos e autores de hoje em dia. Isso pode te beneficiar muito. Aliás, conhecer a literatura brasileira contemporânea e o circuito literário faz grande diferença; não fique só no seu mundinho interno de escritor.
8) Tenha paciência. Não pense em termos de “tudo ou nada”, ou de “se esse livro não for publicado eu vou me suicidar”. O artista-dramalhão já está fora de moda há mais de um século e você já está bem grandinho pra ficar fazendo manha. Tente pensar na carreira de escritor como outra qualquer: você pode começar por baixo e projetar um crescimento a longo prazo. Esqueça um pouco essa expectativa de “estourar” que a mídia costuma propagandear para as carreiras artísticas. Isso é mais uma exceção do que uma regra. Você pode começar como blogueiro, passar para escritor publicado por uma pequena editora depois uma grande, tudo aos poucos, assim como um administrador de empresas pode começar como estagiário, depois assistente e daí em diante. Você não vê esses caras dizendo: “não, eu só vou ficar feliz se for o presidente de uma grande companhia” logo de cara. Mas a gente vê um monte de escritor dizendo que só aceitariam sair por uma grande editora. Pense sempre que se sua carreira for bem, mesmo esse livro que você hoje tem dó de entregar a uma editora pequena pode ser relançado por uma grande. Ah, e pesquise por autores que começaram com edições pequenas e você vai se surpreender com o que encontra. Drummond, um de nossos maiores autores, publicou seu Alguma poesia pela primeira vez com uma edição paga do próprio bolso. Sim, como você pode fazer.
9) Pense bem antes de começar a escrever um novo livro. Não escreva só porque você quer colocar para fora seus sentimentos ou porque quer contar a história de sua família, se você espera ser publicado por uma editora legal. Lembre-se: um livro se faz com o escritor mais os leitores, e ninguém tem tempo de sobra hoje em dia pra servir de plateia para as suas confissões, se elas não trouxerem nada de novo, nada de especialmente interessante, nada que também toque um leitor que não partilha de suas experiências. Então, pense em um projeto que possa se destacar: uma história chamativa, uma linguagem diferenciada, enfim, qualquer coisa que justifique alguém investir seu tempo na leitura do livro que você escreveu, além de seus amigos e parentes. Ah, e não fique escrevendo um monte de livros, um atrás do outro, se eles não chegaram muito longe. Provavelmente será muito mais produtivo você analisar sua própria escrita e tentar aprimorá-la, a fim de escrever (ou reescrever) um livro que de fato valha a pena. Não é muito produtivo acrescentar uma trilogia aos nove romances que já estão na sua gaveta.
10) Invista em concursos literários. Há muitos concursos literários por aí, que dão prêmios em dinheiro ou publicam o(s) livro(s) ganhador(es). Sei que sou suspeito pra falar, já que comecei minha carreira assim, mas é algo que aconselho participar. Talvez você diga: “Mas esses concursos tem centenas de inscritos, a chance de ganhar é 1 em 500!” É verdade. Mas lembra que eu falei que a chance de uma grande editora publicar seu livro era praticamente nula? Então, 1 em 500 já é bem melhor do 1 em 1.000.000. Ah, e uma coisa: inscrever-se pode custar dinheiro, seja porque alguns cobram a inscrição, seja pelas despesas postais. Antes de dizer que não tem grana pra ficar gastando com isso, pense no quanto você gasta com besteiras, em mesas de bar. Um concurso desses pode ser decisivo para sua carreira; programe-se para isso. Talvez você não consiga se inscrever em um ano, mas junte dinheiro, fique esperto nos prazos e trabalhe no livro até o ano seguinte. Foi assim que eu ganhei o Prêmio Sesc e tive meu livro publicado pela Record.
Bom, acho que é isso. Não trate a publicação de seu livro como algo que é o grande ápice, quase inatingível a ponto de fazê-lo crer que não tem capacidade de resolver por conta própria, ou como algo que se cumprido, seja como for, já está de bom tamanho. Isso pode trazer muitos arrependimentos depois da publicação e da “perda da inocência editorial”. Conheça bem o mercado, antes de se aventurar nele: mercado editorial e literatura não são a mesma coisa. E não se deixe seduzir pelas facilidades de publicação de hoje em dia. Um livro publicado é só o começo do que pode ser uma longa carreira, com muitos desafios e alegrias, se você estiver disposto, trabalhar duro e, claro, ter um pouco de sorte (se “tenha sorte” pudesse ser um conselho, estaria listado como um dos mais importantes).
Falando em fins e começos, aproveito para me despedir dessa coluna. Vou me dedicar mais à escrita de meu novo livro, que, como você que leu até aqui, espero ver publicado. Agradeço muito às pessoas que me leram, escreveram e a todo o pessoal do Homo Literatus, pelo convite e pela paciência com este colunista um tanto irregular. Sucesso para todos nós e um bom 2014!