Por que o novo autor não deve querer livros mais baratos

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“Estes investimentos são somados e divididos pelo número de exemplares impressos, para que se defina o preço de capa da publicação. Logo, não há como o livro se tornar mais barato sem afetar diretamente sua qualidade como um todo”.

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É comum encontrar na internet campanhas pedindo a redução do preço dos livros. Campanhas promovidas não por leitores sedentos de literatura e desprovidos de reais; mas sim por escritores e editores que deveriam esclarecer, ao invés de confundir ainda mais a cabeça do novo autor. Até mesmo porque, um escritor ou um editor batalhando por livros mais baratos é o mesmo que qualquer profissional lutando por um salário menor – algo que nunca vi na vida.

Inicialmente é importante que se conheça – e se reconheça – a quantidade de pessoas envolvidas no processo de edição, produção e lançamento de um livro. Acredite, amigo: o escritor é somente uma, das muitas peças de uma engrenagem complexa.

Primeiro, há o revisor. Nenhum livro que se preze é publicado sem que passe por, pelo menos, um revisor profissional. Este revisor obviamente não trabalha só por amor, e precisa comer e pagar aluguel. O valor cobrado varia entre R$2 e R$8 por página em formatação padrão, logo, não é difícil calcular quanto custa a revisão de um livro de 200 páginas, por exemplo.

Depois a obra vai para as mãos do editor. Este profissional fará uma leitura qualitativa do texto, observando palavras repetidas, retirando excessos, analisando concordâncias estruturais e cronológicas. Atividade exaustiva, já que exige do profissional concentração absoluta. E o editor, por mais incrível que pareça, também precisa comer e pagar aluguel.

Enquanto isso, serão realizados todos os registros necessários: ISBN, ao custo de R$40; ficha catalográfica, que sai por R$100; e mais R$40 de averbação na Biblioteca Nacional.

Existe ainda a necessidade de se adquirir uma imagem para a capa, que pode ser uma ilustração ou uma fotografia – mas que possui um preço.

Em seguida, o livro é encaminhado para o diagramador, que irá elaborar a capa e o miolo da obra. Este profissional também come e paga aluguel, e o investimento em seu trabalho vai de R$400 a R$1.500.

Quando volta do diagramador, o livro é novamente lido, tanto pelo autor, quanto pelo editor e/ou revisor, para garantir que nenhum erro passe despercebido. Mais um custo.

Feito isso, o material é encaminhado para a gráfica, onde finalmente ocorrerá sua impressão.

Porém, estando o livro impresso, nada indica que o trabalho terminou – muito pelo contrário.

Neste momento, entra em cena o departamento comercial da editora, que deverá promover a obra junto à imprensa. Estes profissionais confeccionarão todo o material informativo e de publicidade sobre o livro (entrevistas, releases, resenhas, reportagens), e ainda encaminharão estes textos para diferentes veículos de comunicação, assim como enviarão para sites e blogs literários exemplares gratuitos da obra, para resenha e sorteio. Talvez sejam lançados banners, convites, marcadores, cartazes e etc., o que aumenta ainda mais as despesas de produção e impressão.

E, para finalizar, têm as livrarias. Além do contato comercial, cujo objetivo é realizar a venda e disponibilizar a obra para comercialização em diferentes locais, é a editora quem fica responsável pelas tarifas do frete do envio destes exemplares – exemplares, sublinhe-se, adquiridos pelas livrarias com 50% de desconto sobre o preço de capa.

É relevante a quantidade de profissionais envolvidos, e que precisam receber – sendo que seus preços aumentam junto com a qualidade de seus serviços. Estes investimentos são somados e divididos pelo número de exemplares impressos, para que se defina o preço de capa da publicação. Logo, não há como o livro se tornar mais barato sem afetar diretamente sua qualidade como um todo.

Muitas editoras sob demanda, que imprimem tiragens minúsculas, abdicam de boa parte deste processo justamente porque, se forem investir e envolver todos estes profissionais para imprimir 100 exemplares, cada livro vai custar uma pequena fortuna, inviabilizando seu lançamento.

Desta forma, se o autor espera que sua editora lhe forneça esta série de benefícios, é fundamental que trabalhe em cima de uma tiragem alta – no mínimo, mil exemplares. E isso para que o preço final do livro fique entre os R$25 e R$40, preço este que tais campanhas costumam pedir para diminuir.

Compreendo um leitor desavisado reclamar do preço do livro. Mas não aceito que um escritor ou um editor faça coro a este discurso que vai, antes de tudo, contra si mesmo.

Livros mais baratos somente seriam possíveis se os investimentos em produção e impressão diminuíssem. E para que isso ocorresse, seria necessário que baixasse também o custo de vida da população em geral, de modo que o diagramador pudesse cobrar R$100, ao invés de R$600, e mesmo assim conseguisse não morrer de fome.

O mais engraçado é que não vejo estes escritores e editores fazendo campanhas por pizzas mais baratas. Por consultas médicas mais baratas. Por aluguéis mais baratos.

Na atual conjuntura, diminuir o preço do livro significa diminuir a já pequena remuneração do profissional que atua no meio editorial. Significa igualmente um retrocesso para todos os autores que pretendem, um dia, ganhar algum dinheiro com a venda de seus livros. Significa atuar contra a profissionalização da área literária, nivelando-a por baixo, abrindo precedentes para que toda sorte de picaretas e amadores apareçam oferecendo serviços de quinta categoria pela metade do preço, e colocando no mercado livros que saíram do computador do autor diretamente para a gráfica – sem passar por qualquer processo de aprimoramento e produção.

Por isso, ao invés de promover campanhas para diminuir o preço dos livros, que tal trabalharmos para que, um dia, as pessoas entendam que um livro vale mais do que uma pizza, e custa a metade do preço?

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