Sim, eu me interessei em ler Thomas Pynchon, em grande parte, por sua história de reclusão; afinal, desde a publicação de seu terceiro e mais famoso livro, O Arco-Íris da Gravidade (1973), ele se tornou famoso por fugir da imprensa a todo custo. Mesmo morando em Manhattan, Pynchon pode sair na rua sem ser conhecido, pois há anos que não se publica nenhuma imagem oficial dele. Mas enfim, esta é uma resenha de Vineland.
A literatura caótica deste escritor americano está, sem dúvidas, presente em Vineland. No princípio da história, tem-se a impressão de que o personagem principal será Zoyd, um hippie, mas logo o leitor é apresentado à filha de Prairie; e a partir daí, segue-se um desfile de personagens intrigantes; como, o namorado de Prairie, Isaías Dois-Quatro; Frenesi, a mãe de Prairie, que ela não conhece; DL, grande amiga de Frenesi e lutadora excepcional; Takeshi, uma espécie de Manda-Chuva da máfia japonesa; e o, possivelmente, vilão, narcotira, Brock Vond; entre outros personagens que, se citados, mais confundiriam quem lê esta resenha do que traria alguma luz à história. O fato é que Pynchon ao inserir um personagem num capítulo, no seguinte, ele se dedica a contar a história deste personagem, o que acaba por criar uma literatura que, apesar do caos, possibilita a imersão na profundidade dos personagens.
A criatividade satírica do escritor já é conhecida de muita gente, mas vale ressaltar que em Vineland torna-se quase impossível não dar boas risadas quando se percebe a metáfora dos Tanatóides. O termo é estranho, porém trata-se de um grupo de pessoas que vivem retiradas numa cidade própria; todas elas já perderam a esperança de viver, praticamente consideram-se mortos-vivos; e então o autor insere o elemento de crítica e sátira, os Tanatóides dedicam pelo menos um tempo de cada hora desperta a ficarem assistindo televisão, ou seja, você tem que ter perdido a vontade viver para passar tanto tempo em frente ao Tubo, como Pynchon se refere ao longo do livro ao se referir à televisão.
No decorrer da narrativa, percebe-se uma constante “brincadeira” com a realidade. A título de compreensão, separei o trecho abaixo, onde o narrador descreve o nascer do sol na vila dos Tanatóides.
“Se continuassem a observar daquele ponto, à medida que o sol se levantava, teriam visto a cidade se modificando, os cantos das coisas em lenta rotação, as sombras avançando para virar do avesso certos ângulos à medida que as “leis” da perspectiva se restabeleciam, de modo que lá pelas nove horas a versão diuturna do que era para ser visto daquela janela em particular já estaria a postos”.
Vineland é um livro de crítica, bom humor, e uma leitura que exige concentração do leitor, pois a multiplicidade de informações bombardeadas obriga quem o lê a estar de “antenas em pé”. No entanto, o resultado é compensador e satisfatório.
Como eu afirmei que a história era de Prairie, deixo um trecho que se refere a ela; transvestido na metáfora televisiva, como é o livro todo.
“… Prairie encaixada no banco de trás, segurando as pontas, torcendo para que eles pudessem despertar para algo mais benévolo e ser três pessoas diferentes, apenas uma família de seriado de TV num carro familiar, sem problemas que não pudessem ser resolvidos em meia hora de pilhérias e comerciais, a caminho de um alegre fim de semana em alguma praia”.