Você já se perdeu por empréstimo?
Eu sentia falta de emprestar livros das bibliotecas. A saciei por um pouco de acaso e oportunismo – pois essa é uma saudade fácil de lidar – graças a um convite da minha namorada. Ela precisava de um livro disponível na biblioteca do centro de Curitiba e me pediu pra acompanhá-la, e lá fomos durante uma manhã. Enquanto ela perguntava do objeto de sua pesquisa a um funcionário, perguntei a outro de um que não encontrei em outra visita.
Naquela manhã dei sorte e levei Sob o sol de Satã na mochila. Eu li sobre ele na crônica Nosso lado escuro à Solta, da Mariana Ianelli, e fiquei curioso com essa obra de George Bernanos após uma prévia pesquisa virtual. Quando voltei à biblioteca para devolver o exemplar fiquei mais tempo, aproveitando que tinha ido para o centro por outros motivos. Enquanto passeava de seção a outra senti de novo aquela saudade de explorar o acervo de lá, cavar um exemplar magro e surrado de um livro em meio aos exemplares com cheiro de novo e diagramação legível, fazer esforço para ler as letras miúdas e apertadas da única edição disponível de uma obra – justo aquela que procurei com afinco e alguém emprestou antes de mim outra vez, passear em seções distintas daquilo que conheço e costumo ler, encontrar páginas conhecidas minhas, com a diferença de que já consegui um exemplar para chamar de meu de alguns livros, enquanto outros, se mais alguém os tirar de seu ócio de capa fechada, talvez possuam um destino errático de serem emprestados a cada meio ano e um sonho distante de maior circulação.
Passear na biblioteca também é um exercício de inveja, pois eu gostaria que minha estante fosse tão organizada quanto a dela; e também um pouco pelo acervo, embora seja só uma questão de muito tempo até eu escolher e comprar livros antes emprestados. É tentador passar o cartão (da grana que ninguém tem) na promoção do mês ou se dar ao luxo daquela obra nova do autor acompanhado há tanto tempo que parece um amigo próximo, embora esse autocontrole de vez em quando sirva pra alguma coisa.
Certa vez encontrei na biblioteca perto de casa uma edição pequena do Um bom dia para nascer, seleta de crônicas do Otto Lara Resende, e mais de uma vez quis reler pela sensação dos textos que abordam mil assuntos de uma vez em um espaço tão compacto como suas trinta e algumas linhas por crônica. Dei sorte de achar uma edição ampliada para adotar, diferente da lida outra vez. Enquanto leio vagabundamente umas páginas dele junto a outras, sacio essa saudade besta de me perder por empréstimo.