Já imaginou se em meio a uma aula universitária de literatura o professor começar a lecionar sobre nada menos que William Shakespeare e alguém levantar a mão e dizer, em português: “Sim, já conheço a história dele. Shakespeare é meu tio-tatatatatata…taravô!”
Pois bem, Suzana Araújo Kirk poderá um dia. Mas, para entender sua história, deve-se acompanhá-la desde o início.
Enredo
Em 3 de Maio de 1616, segundo o calendário gregoriano. Ou pelo calendário juliano, usado pela Inglaterra ainda naquele século, no dia 23 de Abril de 1616, falecia aos 52 anos de idade William Shakespeare. Sua cidade natal, Stratford-upon-Avon (no condado de Warwickshire , Inglaterra), sentia a perda de uma de suas mais ilustres personagens. Lá Shakespeare nasceu, cresceu, mudou-se, voltou a morar, criou seus filhos, conheceu seus netos e, por fim, faleceu e foi enterrado.
O icônico gênio, por assim dizer, e maior elemento da dramaturgia na história humana deixou herança impar em suas peças, poemas, sonetos, comédias, tragédias e escritos em geral, todavia não foi feliz em sua linhagem genética. De seu casamente com Anne Hathaway (1556-1623) deu-se três filhos e em seguida quatro netos apenas. Infelizmente William teve sua linhagem direta expandida pela história apenas até aquela geração, quando em 1670 faleceu o ultimo de seus netos, cessando sua linhagem.
Por esse motivo que os historiadores atuais se agarram a linhagem pelo lado de quem restou, ou seja, recorrem aos parentes por parte de sua irmã Joan Shakespeare (1569-1646). Ela foi casada com William Hart e, fruto de seu amor, sua linhagem começou ali e perdurou até os dias de hoje.
No presente, quase 450 anos após o nascimento do dramaturgo dos dramaturgos, nasce outra figura ilustre. Uma pequena gota de vida chamada Suzana Araújo Kirk. Mesmo com sobrenome diferente, ainda tem o sangue azul. Filha do sobrinho-neto de 13º grau de Shakespeare, o canadense Scott Kirk e de sua esposa brasileira Dayane Kirk. Ocorrido em dezembro de 2013, o nascimento foi festejado longamente pelo pai. Ele por sua vez tem admiração pelo membro mais ilustre de sua família e para tanto tatuou o brasão da família Shakespeare no braço. Tamanha foi a alegria de ambos os pais e a admiração pela linhagem que pediram e foram atendidos à solicitação de batizar sua filha na mesma igreja que William foi batizado e enterrado, a Holy Trinity Church.
Sagrado por diferentes motivos a diferentes pessoas
Para aqueles que estranharam, aqui está a explicação:
Sim! Shakespeare está sepultado na mesma igreja da qual foi batizado. Seus restos permanecem próximo ao altar principal, juntamente com vários de seus parentes mais próximos.
Ele nunca foi dono de nenhuma fortuna, mas pertencia à classe média da época, e ao final de sua vida pode comprar um espaço dentro da igreja para que fosse enterrado.
Na época era comum esse tipo de pratica. A atual igreja anglicana com mais de 800 anos, Holy Trinity Church aceitou o ilustre hospede. Todavia, na época Shakespeare não era tão famoso e sua projeção como dramaturgo lendário só veio à tona no século seguinte. O fato central, portanto, foi a hospedagem eterna do patrocinador do “túmulo”.
A igreja e a cidade vieram a ganhar com seu ilustre personagem a partir dessa época.
Há quem diga que seria até um sacrilégio, uma profanação se ajoelhar numa igreja e mesmo olhando em direção a Jesus Cristo, pensando em Deus até, mas que também fizessem referencia a Shakespeare, pois ali estaria ele enterrado, próximo ao altar.
Carolyn Smith, sacristã da igreja em 2014, confirma que a família Shakespeare ocupa todo o chão na parte frontal do altar, e que ao final da vida o autor estava numa ótima condição financeira e pagou muito bem para que tivesse o direito de “descansar” em solo sagrado. E adiciona que muitos acham estranho, e os padres acham mais ainda, mas que há pessoas ajoelhadas fazendo referencias a Shakespeare e não a Deus, isso sim há! Mas, reafirma, aquele lugar é sagrado para diferentes pessoas por diferentes motivos. Uma justificativa um tanto interessante.
Ano de comemoração
A notícia de mais uma parente, e ainda brasileiro, chegou e foi muito bem recebida pela cidade natal do autor, Stratford-upon-Avon, que este ano comemora os 450 anos de Shakespeare.
A pacata, pitoresca e pequena cidade sobrevive da fama de seu famoso cidadão. Festivais e atrações são itens comerciais certos para atrair turistas e interessados. Miniaturas em lojas e brinquedos produzidos com a temática shakespeariana são campeões de vendas. Encontros de historiados, grupos de discussões de adaptações dos textos de William, peças e dramatizações teatrais lotam plateias, análise de influencias cinematográficas das obras do autor… enfim, são inúmeras as possibilidades de exploração e sobrevivência.
E agora, certo publico brasileiro pode ter sua atenção voltada para a cidade, já que uma nativa brasileira entrou para a família de sangue nobremente teatral.
Mas, em fevereiro passado a atração principal foi uma pequena criança em seu batizado.
Suzana Araújo Kirk, que tem seu primeiro nome em homenagem a uma das filhas do autor, foi vista por milhares, se não milhões de pessoas. O batizado, não sem exageros, aconteceu na Holy Trinity Church e teve a missa e o todo o processo de batismo transmitido e televisionado pela pátria mãe do famoso autor, e redistribuído o sinal para diversos outros países. Tudo em prol da disseminação da ideia da imortalidade de Shakespeare atravessando mais uma geração, e agora abrangendo as terras tupiniquins.
Vida
De Shakespeare pouco se sabe, além das projeções, datações e especulações quanto aos momentos de lançamento de seus textos, não se sabe muito sobre sua vida. Biografia é um tipo de livro que entrou em pratica por volta de 1670, certo tempo depois da morte do autor.
Além desse fato, as criticas, duvidas e controvérsias que envolvem o dramaturgo abarcam até mesmo a incerteza da sua real autoria sobre todos os textos aclamados como sendo dele.
Entretanto, sem fontes seguras e provas concretas, tais afirmativas duvidosas se perdem ao esmo, e o que resta é a imortalidade da genialidade poética de uma criatura que viveu uma vida plena e totalmente dedicada a deixar um legado sobre a Terra. O que lhe trouxe fama maior e tardia, mas que permanece até hoje. Tamanho é o respeito, fama e admiração de seu publico que faz com que um reles parente seu nasça depois de 450 anos de seu próprio nascimento e ainda seja ovacionado meramente por pertencer à mesma família!
Isso é ser Shakespeare em 2014.