Noventa por cento dos escritores brasileiros contemporâneos já chupou Rubem Fonseca!
E não há mal nisso – desde que se consiga encontrar a própria voz e inventar um mundo particular. Shakespeare, por exemplo, chupou de muita gente. E Aristóteles dizia que a imitação está na gênese de toda forma de arte. Há bons exemplos, como Marçal Aquino, Luiz Rufatto, Flávio Carneiro, Fernando Bonassi, de autores influenciados pelo brutalismo e humor negro de José Rubem Fonseca, o cara que inventou a mentalidade urbana na literatura brasileira.
Ele completa 90 aninhos neste 11 de maio. Desde os anos 60, quando surgiu com Os prisioneiros, o escritor começou a se tornar uma das vozes mais originais e (talvez por isso) influentes da nossa literatura, provando, ainda, que era um autor à frente de seu tempo, mesmo que a realidade brasileira seja capaz de surpreender a imaginação mais prodigiosa. Basta ler os jornais e/ou assistir aos telejornais. Pena tudo não ser apenas ficção.
Por falar nisso, a sua obra-prima, Feliz ano novo, completa 40 anos agora em 2015 – prato cheio para quem gosta de datas redondas. Foi este o livro que me fez conhecer o universo do escritor – aula de literatura no ensino médio, há 15 anos. Em 76, um ano após a publicação, os milicos proibiram o livro em todo o território nacional, sob a alegação de conter “matéria contrária à moral e aos bons costumes”. Anacrônica indignação do establishment.
Fonseca diz ser um cineasta frustrado que acabou virando escritor. Graduou-se em Direito, foi delegado de polícia, executivo da light, tem medo de virar celebridade e não tem planos de deixar de nos presentear tão cedo. Lançou livro novo, Histórias curtas, que é a quintessência de seu estilo, segundo a crítica; vai roteirizar para os quadrinhos O seminarista, seu 11º romance, e os mais chegados dizem que pode vir um livro de poemas por aí. Oxalá.
“Nenhum escritor gosta realmente de escrever. Eu gosto de amar e de beber vinho: na minha idade eu não deveria perder tempo com outras coisas, mas não consigo parar de escrever. É uma doença.” Não é uma fala dele, mas de um dos seus personagens, um escritor que concede uma entrevista a um repórter, no conto Intestino de Grosso, o último de Feliz ano novo. Avesso aos jornalistas, ele sempre se limita em dizer que tudo está nos livros.
Pra terminar um pouquinho de Rubem Fonseca, o início de Intestino Grosso:
Telefonei para o Autor, marcando uma entrevista. Ele disse que sim, desde que fosse pago – “por palavra”. Eu respondi que não estava em condições de decidir, teria primeiro de falar com o Editor da revista.
“Posso lhe dar até sete palavras de graça, você quer?”, disse o Autor.
“Sim, quero.”
“Adote uma árvore e mate uma criança”, disse o Autor, desligando.
Ah, grande Rubem Fonseca, qualquer dia desses você ganha o Nobel de literatura. Por todos os bons momentos que proporcionou a mim e com certeza a tantos outros, te desejo feliz aniversário – e vida longa também!