Três livros para (tentar) compreender a Era Dilma

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Pouco mais de um ano após a abertura do processo de impeachment de Dilma Rousseff, editoras apostam em livros que falam sobre o governo da petista 

Foto: EVARISTO SA/AFP/Getty Images

Dilma Vana Rousseff foi a primeira mulher a ser eleita presidente/a do Brasil. E também foi a primeira a sofrer um processo de impeachment.  Perseguida pela ditadura militar, secretária estadual no Rio Grande do Sul no inicio dos anos 2000, ela foi durante os governos Lula (2003-2010) ministra das Minas e Energias e da Casa Civil. Em 2010, tornou-se a escolhida pelo ex-presidente para disputar as eleições. Venceu. A partir daí, os rumos da economia que haviam marcado o governo petista começaram a mudar. E a história do Brasil também.

O breve histórico acima é apenas uma introdução para apresentar ao leitor três livros – de tantos que foram/estão sendo publicados no Brasil – sobre a Era Dilma. As obras escolhidas para esta resenha são: Anatomia de um desastre, de João Borges, Cláudia Safatle e Ribamar de Oliveira (Portfolio Penguin); Como matar a borboleta azul: uma crônica da Era Dilma, de Monica de Bouelle (Intrínseca); e À Sombra do Poder – Os Bastidores da Crise Que Derrubou Dilma Rousseff, de Rodrigo de Almeida (Leya)

Cada uma das obras forma uma parte de um quebra-cabeça que ainda está sendo montado por outros livros e documentários que estão sendo produzidos.

O Anatomia é uma espécie de grande reportagem. Os três autores são jornalistas econômicos, reconhecidos nacionalmente pelo trabalho que desempenham. Ao longo da obra, tratam de mostrar, por meio de dados, notícias já publicadas e relatos de bastidores, como o governo Dilma cometeu erros econômicos e políticos.

Um exemplo. Em 2012, quando Dilma decidiu desonerar vários setores da economia para aliviar o peso da cobrança dos impostos, alguns membros do governo foram contrários, indicando que poderia haver problemas no futuro (e houve!). Dilma não deu ouvidos. “Eu quero emprego”, disse a ex-presidente, de acordo com o livro.

A leitura é muito válida porque traz um panorama da situação local e mundial, além de demonstrar como funciona a economia política brasileira: em que os interesses de grupos falam mais alto que o interesse nacional.

Como matar a borboleta azul, escrito pela economista Monica de Bouelle, é um livro gostoso de se ler. Mas completamente contrário à Dilma. De Bouelle é uma economista liberal, saída da PUC-RJ, para quem Fernando Henrique Cardoso é uma espécie de Deus enquanto Lula e o governos petistas formam o inferno na terra.

Bem: dito isso, o livro flui. Monica é uma economista erudita, mostra os fatos e faz análises utilizando desde obras literárias a filmes do Woody Allen. Como a posição da autora é diferente da do governo Dilma, a leitura é importante para compreendermos o que liberais pensavam/pensam sobre a Era Dilma.  Mas, como afirmou o professor André Luís Campedelli, há um trecho muito infeliz, quando a autora “quando faz uma análise jocosa e debochada dos economistas desenvolvimentistas e heterodoxos, tratando-os como pessoas ingênuas, que não sabem muito bem o que defendem, que apenas querem atacar as ideias de cunho ortodoxo”, escreveu Campedelli.

Eis o trecho:

“O sistema límbico, a parte mais primitiva do cérebro, responsável pelas emoções, reage de modo visceral no cérebro desenvolvimentista. Incandesce quando processa palavras como ‘capitalismo’, ‘mercado’, ‘expectativas’. Acalma-se apenas quando o tronco encefálico, a estrutura mais simples do cérebro, pulsa com os axônios do ‘endividar-se para crescer’ e do ‘expandir o crédito público para impulsionar o investimento’. Não conecta essas deias com a alta de preços a elas associadas à inflação.”

Por fim, À Sombra do Poder – Os Bastidores da Crise Que Derrubou Dilma Rousseff, de Rodrigo de Almeida, é o relato de alguém próximo ao poder. Almeida foi assessor de imprensa do ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy e, depois, da petista. E ele traz informações relevantes que não foram publicadas em lugar nenhum.

Por exemplo, quando Dilma não quis ceder ao então presidente Eduardo Cunha (PMDB), que queria os votos do PT no Conselho de Ética para não ver um processo de cassação de mandato contra ele, em dezembro de 2015. Se os votos fossem dados, Cunha não aceitaria o pedido de abertura de impeachment contra Dilma. A então presidente disse que não poderia ceder a uma chantagista porque, uma vez feito isso, a dose seria repetida sempre.

O livro relata também que, após Cunha ter aceitado o pedido de abertura de impeachment, Dilma e a alta cúpula do governo relaxaram. Sim! Pois sabiam que haveria guerra.

“Havia um certo alívio  na  presidente:  pelo  menos  acabava  a  indefinição  que  estava ‘imobilizando’  o  governo.  O fantasma do impeachment  rondava  o  Palácio  de  maneira indefinida, o deputado Eduardo Cunha pressionava o governo de maneira indefinida, o país parava  à  espera  daquele  processo  de maneira  indefinida.  Indefinição encerrada, caberia traçar uma estratégia para derrotar o pedido de impeachment. ‘Agora é guerra aberta’, disse um dos ministros. ‘É uma luta de projetos políticos diferentes’, emendou outro. ‘Foi melhor assim’, afirmou  mais  um.  ‘Se não  conseguirmos  171  votos  para  derrubar  o  pedido  no plenário da Câmara, é melhor mesmo ir para casa’, confidenciou um quarto (com prudência, disse isso longe dos olhos e ouvidos da presidente).”

O resto da história, ao menos até aqui, sabe-se: Dilma sofreu o impeachment.

Há um caminho certo?

O objetivo fundamental deste artigo/resenha/conjunto de dicas é sugerir a você a leitura de livros que permitam o entendimento do período que o Brasil acabou de viver.

E sim: cada um desses livros tem razão própria para existir. Não há neutralidade em nenhum deles. Se eu pudesse dizer algo sobre isso, diria que: Anatomia de um desastre busca focar em dados sem pender para um lado; Como matar a borboleta azul está à direita e, por fim, À sombra do Poder… Bem, não tenho certeza se está à esquerda do espectro político, mas com toda a certeza não é um livro panfletário pró-Dilma.

 

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