Aproximando-se da literatura, com suas diferentes linhas de narrativa, flashbacks e flashforwards temporais, a série americana True Detective explora em uma mídia diferente as situações encaradas por investigadores
Nos romances policiais, os detetives que protagonizam suas histórias se deparam com situações que levam ao extremo a crueldade exercida pelos seres humanos. A morte passa ser um alento para as vítimas de assassinos que só conseguem encontrar um sentido para suas vidas quando induzem outra pessoa ao sofrimento.
Luis Felipe Pondé, filósofo e colunista da Folha de São Paulo, no texto True philosopher, cita o detetive Philip Marlowe como exemplo desses sujeitos que encaram a podridão humana de perto ao investigar crimes em série. A frieza ritualística com que os assassinatos são realizados faz com que esses detetives, humanos por demasia, sejam pessimistas convictos. Na literatura policial brasileira, há o detetive Espinosa, criado por Luiz Alfredo Garcia-Roza, policial que elabora fatos meramente hipotéticos em sua cabeça para tentar entender como os criminosos pensam.
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Aproximando-se da literatura, com suas diferentes linhas de narrativa, flashbacks e flashforwards temporais, a série americana True Detective explora em uma mídia diferente as situações encaradas por investigadores. Martin Hart (Woody Harrelson) e Rust Cohle (Matthew McConaughey) são os protagonistas de uma investigação que envolve rituais satânicos, pedofilia e assassinatos em série. Criada pelo escritor Nic Pizzolatto, em oito episódios são mostradas, em meio às investigações, a fraquezas de um pai de família machista (Hart) e de um homem destroçado por álcool, drogas e desgraças familiares (Cohle).
Pondé, em seu texto, aponta para o atual cenário do cinema americano, no qual apenas o politicamente correto pode ser exibido. O diretor José Padilha sentiu essa censura empresarial na pele durante a produção de seu RoboCop. As ideias devem ser apresentadas a empresários, que as aprovarão se resultarem em possíveis lucros.
True Detective é uma série crua, suja e tão verdadeira quanto um tapa na cara, driblando qualquer conceito relacionado à moral e aos bons costumes. Se o mergulho na ficção literária torna seu leitor um ser humano melhor e mais crítico, o mesmo se aplica ao espectador dessa narrativa seriada.
Ao fim do último episódio, fica-se a certeza de que o homem é o mais cruel dos animais.