Uma colcha de retalhos que se descostura

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Reconheço-me como um adorador de livros. Além de venerá-los e consumi-los de maneira compulsiva, gosto muito de pesquisar a respeito de obras literárias.

Apesar disso, descobri, na faculdade, que há um elemento que muitas vezes deixa essa atividade um tanto quanto monótona. Tudo o que meros mortais como eu desejamos falar a respeito de determinados autor e obra, devemos recorrer a crítico e texto consagrados, ou seja, ao cânone.

Personagens, enredo, foco narrativo, enfim, ponderar sobre cada elemento, todo tijolo que foi utilizado e considerado pelo escritor até ver sua obra pronta. Então, para fugir do rigoroso sistema acadêmico, descobri uma forma prazerosa de escrever sobre aquilo que li.

Uma resenha bem estruturada pode ser tão boa quanto a narrativa da qual está tratando. O crítico explora subjetivamente o livro lido, fazendo um recorte daquilo considerado essencial na trama, expondo suas sensações particulares, que depois podem ser confrontadas com a de outros leitores, criando-se um grande círculo vicioso. Isto gera a possibilidade de debates. A divergência de pensamentos é o que consagra uma obra.

Um excelente exercício propiciado por essa atividade é a identificação de intertextualidades. Muitos escritores bebem em fontes clássicas e sutilmente as incorporam em seu texto.

É o que fizeram Rubem Fonseca, com o protagonista de suas narrativas policiais Paulo Mandrake, livremente inspirado no detetive Phillip Marlowe, de Raymond Chandler, e Machado de Assis, que elaborou a eterna dúvida a respeito da fidelidade de Capitu na cabeça do pobre Bentinho, pautado na peça Otelo, assinada por Shakespeare. As possibilidades comparativas são inesgotáveis.

Saindo do território literário e indo até à sétima arte, é impossível não pensar em Quentin Tarantino, apontado como um liquidificador de cultura pop, criador de personagens como Django e Jackie Brown, inspirados, respectivamente, em figuras dos estilos western e blaxploitation.

O livro deve ser encarado como um mosaico ideológico, uma colcha de retalhos que se descostura com o intuito de intrigar, instigar e, acima de tudo, humanizar seu leitor.

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