Muito à frente do seu tempo, Monteiro Lobato não só contribuiu para a imprensa de nosso país como foi o responsável pelo movimento do mercado editorial brasileiro, escreveu um romance, proibido nos Estados Unidos, onde um presidente negro vencia as eleições norte-americanas, além de ter sido um dos principais influentes na luta a favor da Legislação do petróleo no Brasil.
Monteiro Lobato nasceu em Taubaté, no interior de São Paulo, em 12 de abril de 1882. Filho de José Bento Marcondes Lobato e de Olímpia Augusta Monteiro Lobato, o futuro consagrado escritor de obras como Reinações de Narizinho, Viagem ao céu e Memórias da Emília, recebeu, primeiramente, o nome de José Renato Monteiro Lobato, mudando mais tarde para José Bento Monteiro Lobato, desejando usar uma bengala com as iniciais J.B.M.L.
Alfabetizado de início pela mãe, Juca, apelido de Lobato quando menino, teve um professor particular, e aos sete anos foi matriculado num colégio. Ainda na infância descobriu a biblioteca de seu avó, o fazendeiro Visconde de Tremembé, e lá tivera o seu primeiro contato com o mundo dos livros. Leu tudo em matéria de literatura infanto-juvenil, o que mais tarde fomentaria em sua obra, trazendo referências de sua infância interiorana na fazenda e as brincadeiras típicas com bonecos feitos por sabugos e vegetais.
Na adolescência, Lobato colaborou para vários jornais no colégio, todos assinados com pseudônimo. E, respectivamente, começaria a escrever contos, o que mais tarde seriam reunidos em Urupês, sua obra inaugural, publicada em 1918.
Aos 18 anos vai estudar Direito, por imposição do avô, embora desejasse fazer Belas Artes, formando-se Bacharel em 1904. Em maio de 1907, foi então nomeado Promotor em Areias, casando-se no ano seguinte com Maria Pureza da Natividade (Purezinha, como era chamada). O casal teve quatro filhos: Edgar, Guilherme, Marta e Rute.
Desde cedo Lobato já mostrava ser dono de uma personalidade forte, que dizia tudo que pensava, agradando ou não. Defendia sua verdade com unhas e dentes. O que mais tarde o levaria a problemas, sobretudo, de natureza política, como foi o caso quando então perseguido, preso e criticado por dizer que no Brasil havia Petróleo e que era preciso explorá-lo para dar ao povo brasileiro um padrão de vida à altura de suas necessidades.
Evidentemente, o ocultamento para com tal afirmativa do escritor vinha de interesses políticos oficiais que não queriam revelar tal patrimônio econômico do país. O apogeu desse momento o inspirou no livro O Poço do Visconde, publicado em 1937.
Vivendo os primeiros anos, como Promotor, no interior, escrevia para jornais e revistas de cidades pequenas, como também para o Tribuna de Santos, Gazeta de Notícias do Rio e Fon-fon, onde mandava também caricaturas e desenhos que fazia — mais um de seus talentos.
Com a morte do avô, o Visconde de Tremembé, em 1911, Lobato herdou a fazenda de Buquira, passando de promotor a fazendeiro. Lá, escreveu Jeca Tatu, personagem caipira que se tornaria símbolo nacional.
Em 1917, vendeu a fazenda, após problemas com a geada e dificuldades financeiras, transferindo-se para São Paulo com a família.
Comprou a Revista do Brasil e começou a editar seus livros adultos, dentre eles: Urupês, Cidades Mortas, Negrinha e O presidente negro ou O choque das raças (romance apocalíptico, publicado em 1926, com pretensão para ser lançado, primeiramente, nos Estados Unidos, a fim de torna-se um best seller no país; porém, para a frustração do escritor, fora recusado por todas as editoras norte-americanas, justamente por tratar sobre um candidato negro que vence as eleições para a presidência nos Estados Unidos no ano de 2228 — o que viria acontecer muito antes do ano proposto no livro, em 20 de janeiro de 2009, com a entrada do Presidente Barack Obama no poder).
Lobato foi o principal responsável pelo movimento editorial brasileiro, já que antes os livros no Brasil eram impressos em Portugal. Fundou a primeira editora nacional: Monteiro Lobato & Cia, que se transformaria depois em Companhia Editora Nacional, porém, sem a sua participação.
Em 1921, dedicou-se à literatura infanto-juvenil, e publicou a primeira versão de Reinações de Narizinho, ainda resumida na primeira parte como A menina do narizinho Arrebitado, dando início à série de títulos elencados pelas personagens do Sítio Pica-pau Amarelo, que mais tarde ganharia adaptações no rádio, teatro, cinema e TV.
Foi o escritor quem traduziu pela primeira vez os livros Alice no país das maravilhas e Alice através do espelho, de Lewis Carroll, em terras nacionais; dentre artigos da Weekly Times, para o Jornal O Estado de São Paulo, e outras obras universais.
Viajou para os Estados Unidos, onde se vislumbrou pelo país, passando a morar em Nova Iorque. O presidente Washington Luís o nomeou adido comercial no país, reconhecendo o escritor como um grande representante dos interesses culturais do Brasil. Acompanhando o progresso das estradas e da tecnologia estadunidenses, fomentou ideias, as quais foram trazidas em sua volta, em 1931, que pregavam a redenção do Brasil pela exploração de ferro e do petróleo. Inspirados nas ideias de Monteiro Lobato, os partidos políticos e os movimentos sociais lançaram uma campanha de rua em defesa ao Petróleo, intitulada “O petróleo é nosso”, que empolgou o país e serviu de pretexto para que o Congresso Nacional aprovasse a Legislação sobre o Petróleo que, na última hora, recebeu uma emenda que criou a Petrobrás.
Em 1945, passou a ser editado pela Editora Brasiliense, que deteve os direitos de suas obras durante anos, até que um choque entre a família do escritor, devido a insatisfação relacionada às últimas reedições da obra na editora, fez com que fosse parar na Justiça. E assim os livros de Lobato passaram a ser reeditados pela Editora Globo (e que de longe transmitem a mesma emoção nas ilustrações em preto e branco da anterior).
Segue abaixo um trecho da última e única entrevista gravada por Lobato para o radialista Murilo Antunes Alves, na Radio Record de São Paulo, em 2 de julho, de 1948, exatamente dois dias antes de falecer:
“Esse negócio de não acreditar no futuro aqui da Terra é consequência da nossa história. Tudo tem fracassado, não há razão para acreditar. Pessoalmente eu acredito ainda em alguma coisa, mas é por uma forma, para não desagradar os patriotas, coitados. Eles têm tanta boa vontade tanto gosto em que a gente lhes diga coisas agradáveis. De maneira que, por causa deles, eu finjo acreditar em alguma coisa. Mas, cá entre nós que ninguém nos ouve, eu também não acredito em mais nada. E tenho verificado o seguinte, só os homens que atingiram ou chegaram a essa filosofia que são felizes. Porque todos que ainda acreditam em alguma coisa acabam levando na cabeça. Só os céticos absolutos é que acertam. De maneira que, cá entre nós que ninguém nos ouve, eu acho que essa é a verdadeira filosofia, não acreditar em nada. Porque tudo é duvidoso.”
Em 4 de junho de 1948, o repórter Esso anunciava, na voz de Heron Domingues, depois de um pequeno silêncio, a morte do escritor, vítima de um colapso, às quatro horas da manhã, na capital de São Paulo:
“…e agora uma notícia que entristece a todos: acaba de falecer o grande escritor patrício Monteiro Lobato!”