Nos arredores da cidade ninguém notava,
Éramos apenas mais dois rostos anónimos
Correndo de mãos dadas, saltávamos
Por entre os despojos da grande metrópole,
Nome maior que a cidade lhe dávamos
Com ironia, gozávamos e ninguém reparava.
Nos arredores lamacentos da metrópole,
Os segundos, na ampulheta, tombavam
grãos de desespero, juntando horas,
sonhos efémeros, saudosas partidas
E chegadas passageiras – demoras! –
Espíritos sufocados pela mesquinhez,
Dizias, e apertavas a minha mão.
Juntas as nossas esperanças, corríamos
Pelas traseiras das casas, despojos
Ou quintais, muros cercando outros sonhos
Outras esperanças, fantasias e ânsias
Que outros, como nós, nunca largaram.
Dentro das casas os sonhos eram
Esboços apenas, de quadros que haviam
De pintar – se nas suas vidas houvera
Aquele momento que tanto aguardaram
Aquelas veredas escondidas que imaginaram
Se houvera nas suas vidas a primavera,
Aqueles caminhos misteriosos que vão
Terminar em douradas mansões,
longos serões – oh vida! – felizes Verões…
Crescemos. Os nossos sonhos eram – são! –
Vidros em queda. E a esperança um espelho
Que nada reflectia – ou apenas um velho
Sonho quebrado no duro chão da vida –
Largaram-se as nossas mãos. Perdida,
A esperança esvaiu-se entre os dedos,
Ficámos sozinhos, nós e os nossos medos…
Hoje, também nós somos habitantes
Dos arredores dos sonhos, da esperança…
Fechámos o centro dos nossos espíritos
– Comércios que abriram falência –
E fomos viver para casas mais baratas.
Agora, de quando em quando, suspiramos
Observamos o horizonte, questionamos
– Mas não queremos ouvir respostas –
Facas espetadas nos nossos corações –
O que é feito do beijo que não demos?
***
(Imagem: Escultura de Briony Marshall)