No Litercultura, Beatriz Bracher e Lourenço Mutarelli discutiram sobre experimentações literárias, moralismo, subversão, loucura, literatura e cinema, adjetivação no texto, horóscopo, leitura dos próprios textos, questões editoriais e leituras recentes
O Litercultura, Festival Literário de Curitiba, trouxe ao Palácio Garibaldi os escritores Beatriz Bracher e Lourenço Mutarelli no dia 27.08. O bate-papo com eles girou em torno de temas como o processo de escrita, experimentações em seus livros, subversão de valores, loucura, moralismo, costumes urbanos e distinções entre literatura e cinema (roteiro e adaptação).
Beatriz é uma escritora brasileira e também roteirista, já ganhou importantes prêmios literários e foi uma das fundadoras da Editora 34. Mutarelli, por sua vez, além de escritor é ator, dramaturgo, fez vários quadrinhos e ilustrou livros. Ambos já tiveram livros adaptados para o cinema ou de alguma forma já trabalharam com cinema, desse modo, cinema, adaptação, texto literário e texto de roteiro foram temas recorrentes em suas falas.
A escritora Beatriz mencionou que o moralismo é uma temática que lhe interessa. A moral no sentido do que é certo ou errado, a qual não se refere àquela moral da sociedade e seus bons costumes. O que interessa para ela é a sua moral própria que a faz tentar ser coerente o tempo todo, como exemplo: o fato de respeitar a escolha sexual de um determinado indivíduo. Como este, digamos, tipo de moral a preocupa, em sua literatura há muito reflexo disso. Tanto escrever quanto ler, para a autora, são operações que trabalham bem questões perversas e moralistas. Nesse sentido, estas atividades são transgressoras e, ao mesmo tempo, intransigentes.
Em relação a ler, Beatriz Bracher destacou, ainda, a diferenciação entre conto e romance no que diz respeito à apreensão da história. O conto lemos em um dia e isso faz, segundo ela, total diferença na apreensão da narrativa. Já o romance, nós ficamos até meses fazendo a sua leitura. Entre esse período de leitura do romance, muitas coisas podem acontecer em nossa vida, novas experiências e vivências e, por isso, podemos mudar nosso modo de ler, interpretar e encarar os fatos apresentados na narrativa, ou seja, tudo isto mencionado pode modificar nosso jeito de ler. O mesmo acontece no processo de escrita, de acordo com ela.
Segundo Mutarelli em suas falas, a literatura é um meio de subverter valores. É por meio da literatura que ele busca uma melhor maneira de lidar com questões de perversão, valores sociais, moralismo, muitos costumes urbanos, ditos como certos ou errados, e com a loucura. O autor destacou que em seus livros faz uma espécie de experimentação da vida interna dos personagens, os quais, em grande maioria, mergulham na loucura. Ainda sobre os personagens, disse que todos são muito parecidos, falando em termos de comparação mesmo. Sobre a escrita e histórias de seus livros, mencionou que elas surgem de pequenas ideias nas quais permeiam loucuras, toques e obsessões, geralmente oriundas de coisas banais que pensa enquanto está com insônia.
Para Mutarelli, a loucura é uma coisa que muda totalmente a vida, não só a de uma determinada pessoas, mas de todos que estão em seu entorno. A loucura, nesse sentido, muda a vida num todo, muda tudo a sua volta. E em seus livros, isso tem aparecido recorrentemente. Além disso, o autor mencionou que todos os seus livros são experimentações, advindas de pensamentos e coisa ridículas, as quais dão origem a toneladas de possibilidades. Seu novo livro, que ainda está por vir, trabalha com isso, as possibilidades das coisas; nele, nem narrador e nem os personagens sabem ou acreditam em nada, o que possivelmente despertará inúmeras dúvidas nos leitores.
No que diz respeito ao cinema e à literatura, também houve discussões interessantes. Bracher deu vida ao argumento do filme Cronicamente Inviável (2000) e aos roteiros de Os inquilinos (2009) e O Abismo Prateado (2011). Para ela, o roteiro de cinema expressa-se por meio de ações, não há muitos mergulhos psicológicos, possíveis em um romance; tudo é muito mais funcional no cinema. O romancista tem autonomia para expressar suas ideias de inúmeras maneiras, pela linguagem e pela estrutura; o roteirista, ao adaptar uma obra literária, tem de recorrer ao som, vozes, cores, aos olhos das câmeras, recursos estes que são poderosos para o cinema.
Mutarelli já teve alguns livros adaptados para o cinema, como O cheiro do ralo e Natimorto, além de já ter atuado em inúmeros filmes nacionais, sendo um dos mais conhecidos Que horas ela volta? (2015). Neste ano, o escritor está fazendo seu primeiro roteiro, atividade esta que ele chamou de “autópsia de um texto”, pois defende que alguns elementos não são adaptáveis. Para ele, roteirizar um texto literário, se assim podemos dizer, é algo muito difícil, prefere escrever um romance e alguém adaptá-lo.
Muitos outros temas foram abordados durante a mesa com os dois escritores: adjetivação no texto, horóscopo/signos, leitura dos próprios textos, questões editoriais e leituras recentes. No entanto, para não alongar demais, este texto fica por aqui, dando um pequeno gostinho do que foi a mesa com Beatriz Bracher e Lourenço Mutarelli, dois grandes nomes da literatura brasileira.
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