Breve fala sobre um Marco

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Um Marco para ser amigo da poesia

O poeta Rafael Iotti estreia sua coluna no Homo Literatus, onde falará sobre livros e afins.

Em 2010, quando terminava o ensino médio e não sabia ao certo o que fazer da minha vida, caiu em minhas mãos o Ode paranoide, do escritor gaúcho Marco de Menezes. Eu já tinha alguma base de leitura, gostava de escrever uns versinhos perdidos por aí, mas quando terminei esse livro descobri que precisava daquilo. Daquilo o quê? Da poesia. “A vida, tenho certeza, é feita de poesia. A poesia não é alheia – a poesia, como veremos, está logo ali, à espreita. Pode saltar sobre nós a qualquer instante […] Os livros são somente ocasiões para a poesia”, dirá o eterno Borges num ensaio do Esse Ofício do Verso.

O Marco morava – mora – na minha cidade natal, descobri. Caxias. E precisei logo, como da poesia, me fazer amigo desse ser. Digo ser, assim, como Heidegger, porque Marco é um ente pra mim, uma espécie de professor, mestre. Parafraseio com imenso sabor um velho conhecido nosso, Nicanor Parra, que diz que os quatro grandes poetas chilenos são três: Alfonso de Ercilla y Rubén Darío. É claro que a ironia do anti-poeta chileno está, além de tudo, do fato de que nem Alfonso e nem Darío foram “chilenos”. Pois eu digo que os quatro grandes poetas caxienses são três: Oscar Bertholdo e Marco de Menezes.

Acompanhei um pouco da criação do Pequena madrugada antes da meia-noite, o novo livro do Marco, pra mim já um clássico da poesia gaúcha, publicado no final do ano passado, em 2016, pela Modelo de Nuvem. E isso, acompanhar o processo de um grande livro, está como um dos grandes feitos da minha vida. No Pequena madrugada há poemas tristíssimos, como “homem-pássaro, 1994”; ou quase-elegias “Dall’Alba morto sem título”; e também poemas-aforismos ou poemas-que-matam, tipo “olhar e não saber se há um velório ou uma festa”. Todos, independendo o estilo, genialmente construídos.

Octavio Paz vai comparar Schlegel a Breton, no início de Os filhos do barro. Na definição de amor, poesia, ironia; erotismo, imaginação e humor surrealista, etc. Coincidência?, pergunta o mexicano – não, já responde. “Persistência de certas maneiras de pensar, ver e sentir”.

O que me encanta no Marco é essa impermanência da maneira de pensar, ver e sentir. É claro que existe muita coisa calcada na mnemônica marquiana; assim como no seu livro mais célebre, Fim das coisas velhas; e no final de sua carreira poderemos dizer que, em todos os livros, Marco escreveu um poema; um grande poema; em extensão e importância. Mas será um poema volúvel, que muda e se transforma, assim como a história, ou anti-história, dos poetas. Não haverá vitória para os exegetas. Como disse Oswald: “venceu o sistema de Babilônia / E o garção de costeleta.”

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