Crônica: Quando não nos resta escolha – Juliano Rodrigues

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Há momentos em que sentimos que nossa sanidade está se esvaindo, que a rotina, as tarefas, estão nos consumindo e retirando algo de nobre que há em nós. Notamos que se ficarmos parados perderemos tudo o que temos em nossa personalidade, algo começa a se deteriorar, nestes momentos não nos resta escolha, devemos lutar.

Venho sentindo isso a algumas semanas, até pensei em cursar Psicologia, para fazer um auto-tratamento durante o curso, ou algo do gênero, ser uma pessoa “bem resolvida” seria a expressão talvez. Mas, isso não resolveria, um divã não resolveria, há situações em que é preciso arregaçar as mangas.

Cheguei em um momento crítico, estou com dificuldades em sonhar, quão abominável é a vida sem sonhos, sem devaneios, ela fica insuportável. Nós artistas e arteiros gozamos de uma dádiva e maldição, a de termos uma sensibilidade aprimorada, percebemos coisas que a maioria não vê, estas percepções muitas vezes geram uma angústia inenarrável, e precisamos colocar isso pra fora, ou morreremos. De fato enlouqueceremos, não da loucura saudável que já possuímos, mas no abismo da perda de perspectiva.

Estou lendo um livro que me ajudou a retomar o rumo, buscar o progresso, é do Ray Bradbury, O Zen e a arte da escrita. Foi o chefe Vilto que me emprestou. Li uma frase que me impactou e trouxe a tona a verdade: “Não escrever para muitos de nós, é morrer.” Escrever é um dom, uma dádiva, mas que se não executada cobra o seu preço. É como um carro, que precisa rodar e precisa de manutenção, se ficar apenas parado na garagem estraga, assim somos nós.

Então, para voltar a sonhar, preciso executar, então não irei passar sequer um dia sem escrever. Estou quebrantado e preciso juntar os cacos, reconstruir minha alma. Sinto que até minha escrita anda péssima, excesso de férias (de escrever) me fez mal, a realidade, o mundo, me destruiu. Como diria Ray: “Se você não escrever diariamente, os venenos se acumularão e você começará a morrer, ou a enlouquecer, ou a ambos”. Ele avança dizendo: “Nas minhas jornadas percebi que fico ansioso se passo um dia sem escrever. Dois dias, começo a tremer. Três dias, suspeito de demência. Quatro dias sou um porco chafurdando na lama.”

Minha escala não chega a ser diária como a dele, mas sinto isso. Só o que me resta é escrever, e tenho feito isso todos os dias desde a semana passada. Tenho como meta não deixar de escrever um dia sequer, para isso me propus a rabiscar crônicas, poesias ou contos, na falta destes escreverei e-mails saudosos ou até mesmo receitas de bolo… aguardem por surpresas! Percebi que escrever diariamente é fácil, porém ainda tenho feito de forma rasa, na maioria dos dias não passo de rascunhos. Já são sete dias de propósito, agora oito, teve dias em que escrevi apenas um recado mais elaborado, outro em que percebi que iria dormir sem escrever, peguei uma folha,  uma caneta e rabisquei:

“meia hora pra escrever
mas o que escrever afinal
Se a mente está em crise
e as ideias ñ fluem como
deveriam?

Pudera eu renovar a
minha mente e ter
um êxtase criativo,

Bem, enquanto ñ
vem irei buscar
a poesia do sono.

Mantive a formatação original e rudimentar do texto, o processo criativo é o que importa, revisão neste caso aniquilaria o que desejo expressar. Após estes dias tenho notado progressos, mesmo que tímidos, ainda estou com dificuldades em sonhar, mas tenho esperança. Ter de escrever me força a ler, tenho lido principalmente a Palavra, o que tem me edificado, se preciso reconstruir nada melhor do que utilizar de uma Pedra Angular, assim como, de uma Rocha como base.

Enfim, espero que minha escrita esteja voltando a ser aprazível, pois se “passo um dia sem escrever eu noto, se passo dois os críticos saberiam e se passo três o público saberia” adaptado de um pianista. Também, deixo claro aqui uma grata surpresa, o livro que o meu amigo Vilto Reis tinha me emprestado me edificou tanto que se tornou um presente. Agora é meu, obrigado, tomei esta liberdade, sei que irás rir e se irar um pouco, mas que irás concordar caro amigo. Até breve meus leitores, espero que tenham paciência comigo e aguardem por surpresas.

Comente aí quem já viveu loucura similar, vamos nos edificar mutuamente como artistas e arteiros.

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