Djamila Ribeiro consegue ser didática e com discurso para todos públicos ao discutir feminismo negro

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Djamila Ribeiro consegue ser didática e com discurso para todos públicos ao discutir feminismo negro
O que é lugar de fala? é minimanual para entender o outro. Escrito por Djamila Ribeiro, mestre em filosofia, o livro nos ajuda a compreender a posição da mulher negra na sociedade, que é majoritariamente branca
Djamila Ribeiro nos ajuda a entender o que é o feminismo negro em livro
Djamila Ribeiro nos ajuda a entender o que é o feminismo negro em livro | Foto: El País

Apesar de a maior parte do Brasil ser composto por pessoas negras e pardas (54%), vivemos sobre a égide racista. As posições de poder são ocupadas por homens; as representações sociais mais importantes são de homens. A situação fica ainda mais complexa quando se pensa na mulher, que está abaixo do homem. E a mulher negra, então? Abaixo do homem branco, da mulher branca e do homem negro.

Pense: quantas escritoras negras você já leu? Quantas professoras negras você teve? O livro O que é lugar de fala?, de Djamila Ribeiro, publicado em 2017 pela editora Letramento, nos ajuda a pensar em questões como as apresentadas acima. Com pouco mais de 100 páginas, o ensaio é uma excelente oportunidade de refletir sobre o outro; ou, como diz Djamila, a partir de reflexões pautadas por Simone Beauvoir e Grada Kilomba, o outro do outro.

“O propósito aqui não é impor uma epistemologia de verdade, mas de contribuir para o debate e mostrar diferentes perspectivas”, escreve Djamila.

Uma das vantagens que ficam muito perceptíveis de inicio é a linguagem. Colunista de “Carta Capital”, a autora escreve de forma contundente, mas simples, didática, sem pedantismo. É um ótimo livro para a pessoa com doutorado e para aquela fora da academia.

Amém por isso, aliás.

Enquanto a academia falar para si mesma, com toda a certeza irá mudar pouco ou quase nada: afinal de contas, convertidos não se convertem mais de uma vez.

Djamila faz um apanhando histórico. O foco é a mulher negra; mas, partindo do método hegeliano de análise histórica, começa do maior para chegar menor: avalia, portanto, essa mulher a partir da mulher branca.

Ribeiro, negra, reconhece que a mulher branca também enfrenta preconceitos. Mas sabe que a negra sofre mais.

Ela não se furta ao debate que envolve feminismo e marxismo: este último, em linhas gerais, diz que a principal luta é a de classe, não a de raças; feminismo negro entende isso, mas aponta a lança para a briga entre as raças – sabendo que uma coisa está ligada à outra.

Djamila lembra que a ideia da mulher como um ser frágil, que necessita de proteção, está diretamente vinculada à mulher branca: a negra, escravizada, utilizada sexualmente por senhores proprietárias, sempre foi vista como forte, aquela que aguenta ser usada como objeto sexual, como escrava e afins.

Ou seja: a branca, em relação à negra, teve (tem) mais este privilégio.

Mas o que é lugar de fala?

Basicamente, lugar de fala é o local de onde uma pessoa emite uma mensagem. Nessa emissão é levado em conta uma série de fatores: raça, classe social, escolaridade etc.
Tudo isso legitima ou não a verdade do discurso – e a aceitação nos meios em que a mensagem é recebida.

“Quando falamos de direito à existência digna, à voz, estamos falando de locus social, de como esse lugar imposto dificulta a possibilidade de transcendência. Absolutamente não tem a ver com uma visão essencialista de que somente o negro pode falar sobre racismo, por exemplo.” (p. 64)

Djamila também explica que é necessário entender os grupos sociais como responsáveis pelo lugar de fala, não apenas o indivíduo. E que isso não significa que apenas quem sofre racismo, por exemplo, pode falar sobre isso. Lugar de fala não é para silenciar o outro, é para reconhecer o seu espaço e o espaço do outro.

Eu, como homem negro e heterossexual, aprendi muito com a leitura. Quem ler, com toda a certeza, aprendera também.

Amém por isso.

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