A primeira vez que li O morro dos ventos uivantes foi durante o ensino médio. Confesso que não gostei muito do livro e logo o deixei de lado. Para mim, uma história sem final feliz parecia um tanto sombrio. Depois, um pouco mais madura, entendi o contexto histórico em que Emily Brontë escreveu seu único romance, considerado uma jóia da literatura inglesa do século XIX. A questão é que a Europa estava vivendo a época do Romantismo, e uma das faces dessa linha literária é o lado gótico. Acredita-se que é através da morte que o verdadeiro amor pode alcançar o ponto mais sublime. Teoricamente isso é muito poético, e confesso que eu adoro isso… nos livros. Mas na vida não é bem assim – é gótico demais para a realidade.
Para quem não conhece, O morro dos ventos uivantes retrata a história de uma geração inteira perdida por causa do ódio e da vingança – sentimentos tão contrários ao amor. Heathcliff é um menino órfão que foi adotado pelo Sr. Earnshaw e que cresceu ao lado dos filhos do bom homem, Catherine e Hindley. Alguns anos mais tarde, quando o Sr. Earnshaw falece, Heathcliff é rebaixado pelo irmão adotivo à posição de criado. Ele e Catherine continuam grandes amigos e ali se acende a chama de um amor que daria muito que falar. A história vai, a história vem, Heathcliff foge ao ouvir que Catherine pretendia se casar com o novo vizinho, o jovem Edgar Linton, já que ficar com Heathcliff iria contra todos os padrões sociais. Algum tempo mais tarde Heathcliff retorna e entre vários altos e baixos alternados entre paixão e sentimentos de vingança, Catherine adoece e morre, deixando para trás uma filha.
Vou parar o resumo da obra por aqui, pois é sobre o amor de Catherine e Heathcliff que desejo comentar. Tudo pra não dizer que não falei de amor… Dois trechos me marcaram muito na obra de Brontë. O primeiro é quando Heathcliff vai até o leito de morte de Catherine e desabafa:
“Tu me amavas… que direito tinhas então de me deixar? Que direito… responde-me… por causa do miserável capricho que sentiste por Linton? E quando nem a miséria, nem a degradação, nem a morte, nem nada que Deus ou satanás pudesse inflingir-nos poderia separar-nos, tu, por tua própria vontade o fizeste. Eu não parti o teu coração… foste tu que o quebraste e, quebrando-o, quebraste também o meu.”
Essa fala em especial nos traz o sentido do verbo amar. Catherine partiu o próprio coração ao abrir mão de seu amor para seguir o que a sociedade exigia dela; e dessa maneira, ao impor-se esse sofrimento, ela fez com que Heathcliff sofresse. A pessoa que ama se preocupa com o outro mais do que com ela própria, pois a felicidade do outro é a sua própria felicidade. Assim como a ruína do outro é a sua própria ruína.
O segundo é quando Heathcliff recebe a notícia de que Cathy estava morta. Ele faz uma pequena prece ao espírito da amada:
“Fica sempre comigo… encarna-te em qualquer forma… torna-me louco! Só não quero que me deixes neste abismo, onde não te posso encontrar! Oh, Deus! É inexprimível! Não posso viver sem a minha vida! Não posso viver sem a minha alma!”
Quem realmente amou sabe a dor que é ficar longe da pessoa amada. Muitas vezes a ilusão do sonho é menos amarga do que a realidade da perda. Nós preferimos a loucura à ausência daquele que dá cor as nossas vidas. Eu compreendo Heathcliff, e não fosse o seu desejo doentio de vingança eu o colocaria entre os meus heróis preferidos da literatura.
Sendo assim, o que posso eu dizer dessa grandiosa obra? Num mundo onde o eterno dura apenas alguns meses, acredito que devemos buscar resgatar esse conceito de amor incondicional. Esse amor que tudo suporta e que atravessa os anos, inabalável. É um pensamento utópico, sonhador demais? Talvez. Mas não é poético? Não é maravilhoso o sentimento que você tem ao ver um sorriso nos lábios de quem ama?
Ninguém precisa morrer por amor ou de amor, mas deve buscar vivê-lo em sua totalidade. A eternidade não está na morte. A eternidade está em cada dia – está na vida.