Eu adoro o filme O segredo de Brokeback Mountain. Acho forte e delicado ao mesmo tempo, com atuações magníficas e um instigador à empatia – como não sofrer junto com o amor dos caubóis, casados e comprometidos com uma moral que não lhes retribui em nada? Ennis Del Mar e Jack Twist são personagens complexos, cheios de nuances e vivem uma história que vai dando cutucões no espectador. Além disso, Jake Gyllenhaal e o saudoso Heath Ledger estão impecáveis nos papéis e nos conflitos de ambos. Apenas para fazer uma breve retrospectiva, eles e o filme foram indicados ao Oscar, mas no escandaloso ano em que Crash venceu como melhor filme. Constrangedor até para Jack Nicholson, que apresentou o prêmio.
Semana passada, ganhei de um amigo o livro Curto alcance, que contém diversos contos que se passam no Wyoming, dentre eles o conto que originou o filme. A autora, Annie Proulx, foi indicada ao Pulitzer e, com maestria, faz das narrativas uma espécie de turismo com o leitor pelas fazendas do estado americano. Eu recomendo o livro como um todo: no entanto, a história que se passa em Brokeback Mountain ganha destaque por não poder ser mais atual, ainda que se passe há mais de 30 anos. Mesmo que tenha se passado tanto tempo, mesmo que seja ficção, ela poderia ser um conto de jornal de hoje. A história do caubói morto por ser gay e de como isso é uma tradição que vai assegurando a masculinidade dos envolvidos cria na mente do leitor um paradoxo temporal.
Além disso, a técnica crua e objetiva de Proulx torna a leitura fácil e prazerosa, deixando que o enredo intrincado ganhe espaço em relação a uma forma muito complexa. Os diálogos dos caubóis, a percepção das esposas de ambos sobre o que erma de fato as idas a Brokeback Mountain e as pescarias que sempre eram bem-sucedidas, embora sem nenhum peixe e os sonhos com Jack que começam e terminam o conto são, simultaneamente, hipnotizantes, cortantes e afetuosos com o leitor.
A história de amor centra-se mais em Ennis, que tem mais dificuldade de entender sua atração e sua paixão por Jack e é através do olhar dele que a história é contada. O narrador é ciente apenas das mesmas coisas que Ennis, o que permite ao leitor o choque de saber que Jack ocasionalmente vai ao México buscar prostitutos e também sentir em primeira mão o conflito da resistência de Ennis em ir morar com Jack, com medo da “chave de roda.”
Curto alcance é sensível e altamente recomendável, além de oferecer outros contos que são igualmente bons e fortes, rápidos de ler e que ficam na cabeça por dias. Annie Proulx foi uma descoberta muito feliz e, por isso, passo-a para frente.