50 Poemas de revolta: indignação em poemas brasileiros

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50 Poemas de revolta: indignação em poemas brasileiros

50 Poemas de revolta, antologia publicada pela Companhia das Letras, reúne 34 poetas brasileiros, consagrados e contemporâneos, que expressam indignações diversas em seus textos poéticos

Poemas de revolta _ carolina maria de jesus
Carolina Maria de Jesus, uma das escritoras da antologia 50 Poemas de revolta

Poemas de revolta contra a ganância humana, o autoritarismo, a opressão, a exclusão, o ódio, o preconceito, a intolerância, a corrupção, acomodação, a falta de sentimentos. Por que o poema não poderia apresentar revoltas? Não é o poema, entre outras coisas, o meio de expressão do eu-lírico, seja ele tomado por revolta ou não?

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Poemas expressando revolta

50 Poemas de revolta é uma antologia que apresenta textos poéticos de 34 poetas nacionais, alguns pertencentes à nova geração de escritores brasileiros, outros já canônicos. Nessa obra, todos os poemas são impressionantemente atuais, mesmo aqueles publicados em outras décadas. Tratam-se de poemas de denúncia, pois apresentam alertas e críticas sobre tempos sombrios.

Muitos dos poemas da antologia ganharam visibilidade em momentos importantes da história brasileira. Há poemas, por exemplo, da semana de 22 (modernismo); de 45, geração do pós modernismo; dos anos 50, apresentando o concretismo; poemas vanguardistas dos anos  60 e 70; chegando a poemas contemporâneos, publicados em 2016, ano do golpe, que alguns chamam de impeachment.

E por que nossas revoltas ainda são as mesmas? Os poemas mostram um Brasil repleto de injustiças, inseguranças, ganâncias, explorações, opressões, violência, intolerâncias, preconceitos, entre outras coisas ruins, tanto no que se refere ao passado, como no período de ditadura militar, quanto no que se refere à atualidade ou eventos recentes. O problema é que, mesmo nos poemas mais antigos, vemos situações que se assemelham muito à nossa realidade, sobretudo no que diz respeito às questões políticas e sociais.

Há esperança também. Para não dizer que não falamos dela. Alguns poemas expressam desejo de mudança, fé no futuro, sonhos, utopias. Nunca é demais ter alguma esperança em meio ao caos.

Perspectivas

Algo muito bacana dessa antologia de poemas de revolta é que as revoltas são apresentadas tanto por poetas homens como por mulheres. Uma ação sensata porque que muitas das antologias nacionais esquecem as poetas, mesmo aquelas consagradas.

Estão na antologia autores como Drummond, Gullar, Vinícius de Morais, Cacaso, Chacal, Torquato Neto, Leminski, Mario de Andrade, Fabrício Corsaletti. E dentre as autoras estão: Alice Ruiz, Conceição Evaristo, Carolina Maria de Jesus, Laura Liuzzi, Hilda Hildt, Ana Cristina Cesar, Angélica Freitas etc.

Poemas famosos marcam presença em 50 Poemas de revolta. Dois exemplos são: “Descobrimento”, de Mario de Andrade, e “A flor e a náusea”, de Drummond. Também há poemas contemporâneos que já nasceram clássicos. Exemplos: “a mulher quer”, de Angélica Freitas, e “Vozes-mulheres”, de Conceição Evaristo.

***

Leia dois poemas na íntegra:
Poema do aviso final
(Torquato Neto)

É preciso que haja alguma coisa
alimentando o meu povo; 
uma vontade
uma certeza
uma qualquer esperança.
É preciso que alguma coisa atraia
a vida
ou tudo será posto de lado
e na procura da vida
a morte virá na frente
e abrirá caminhos.
É preciso que haja algum respeito,
ao menos um esboço
ou a dignidade humana se afirmará
a machadadas.

 

Vozes-mulheres
(Conceição Evaristo)

A voz de minha bisavó ecoou
criança
nos porões do navio.
Ecoou lamentos
de uma infância perdida.

A voz de minha avó
ecoou obediência
aos brancos-donos de tudo.

A voz de minha mãe
ecoou baixinho revolta
No fundo das cozinhas alheias
debaixo das trouxas
roupagens sujas dos brancos
pelo caminho empoeirado
rumo à favela.

A minha voz ainda
ecoa versos perplexos
com rimas de sangue
e fome.

A voz de minha filha
recolhe todas as nossas vozes
recolhe em si
as vozes mudas caladas
engasgadas nas gargantas.

A voz de minha filha
recolhe em si
a fala e o ato.
O ontem – o hoje – o agora.
Na voz de minha filha
se fará ouvir a ressonância
o eco da vida-liberdade.

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